Por Francis Schaeffer
Tendo
enfatizado que Jesus precisa ser o centro de nossa vida, quero mencionar quatro
outras coisas que devemos cuidar de não pôr lá. A primeira é qualquer estado
totalitário ou qualquer igreja totalitária. Se eu tenho a perspectiva que os
discípulos foram instruídos a ter no Monte da Transfiguração – “este é meu
filho amado...a ele ouvi” – então não há lugar nenhum para qualquer coisa
totalitária! Nem uma igreja que se impõe entre o indivíduo e Deus, nem um estado
que exige lealdade primária tem tal direito. Há um lugar legítimo tanto para o
estado como para a igreja, mas não no centro. O centro precisa ser uma Pessoa.
Estados
totalitários, autoritários, não estão longe de nós. Sentimos seu hálito em
nossas nucas, a cada volta – não só em países comunistas, como também em elites
modernas do mundo ocidental. O cristão sempre deve dizer: “Quero que o estado e
a sociedade tenham o seu lugar apropriado. Mas se tentarem chegar ao centro da
minha vida, sou contra, porque só Jesus deve estar lá”.
Esse
perigo é mais sutil num cenário religioso, e especialmente em um cenário
evangélico, quando manifestado na forma de uma liderança humana totalitária,
autoritária. E porque isso também costuma fazer pressão sobre nós, devemos ter
cuidado constantemente. Deve haver liderança humana na igreja, sob a liderança
do Espírito Santo, mas é errado aos homens, mesmo os homens bons, assumirem
para si o centro. A mentalidade de Paulo, como vimos, não era essa. Nem a de
João Batista. Só o Deus triúno pode ser central. O perigo não precisa vir de um
Hitler ou Stalin. Pode vir de um cristão que se empolga tanto com a mecânica da
liderança que, inconscientemente ou não, põe-se no lugar onde só Deus deve
estar.
Se
vivêssemos num estado totalitário, estaríamos bem apercebidos disso. E mesmo
numa igreja, uma liderança totalitária, autoritária, provavelmente nos faz
sentir desconfortáveis, como um casaco muito apertado. Mais difícil de
detectar, porém, é uma fase do trabalho cristão se tornar central em vez de
Cristo e a Trindade serem centrais. Quando o trabalho cristão se torna o centro
de integração, isso também é errado.
É
curioso que nós podemos fazer coisas em nome de Cristo ao mesmo tempo que o
empurramos para fora do palco. Consigo ver isso mais claramente quando uma
igreja se empolga com um projeto de construção e move o céu e a terra para
completá-lo. Uma cobertura sobre nossa cabeça é necessária, mas isso é só uma
parte mínima do ministério da igreja. O edifício é apenas um instrumento.
Lutar
pela evangelização e salvação de almas também não se deve tomar a importância
primária; mas quantas vezes isso acontece! Outras pessoas, com razão, veem a
igreja ameaçada por apostasia, mas também passaram a fazer a pureza da igreja
visível o centro de sua vida. Em todos estes casos Jesus pode permanecer como
tópico de conversa, mas sua centralidade verdadeira foi esquecida. Em nome de
Cristo, Cristo é tirado do trono. Quando isso ocorre, mesmo o que é certo fica
errado.
Mas
sutil ainda é tornar certas doutrinas o ponto central. Por exemplo, podemos
calcular: Eu sou presbiteriano, por isso vou dar ênfase acima de tudo à
doutrina da predestinação. Sim, a soberania de Deus deve ser ensinada, mas
alguns de meus amigos o enfatizaram tanto que a doutrina, e não Deus, tem se
tornado o centro de seu ministério. Isso pode acontecer com outras doutrinas.
Certamente você já conheceu pessoas que tanto enfatizaram o tipo de batismo que
uma pessoa deve ter que isso se tornou o centro da conversação, o centro da
batalha, realmente o centro da perspectiva. Logo que fazemos isso com qualquer
doutrina, é como um pneu furado que faz o carro inteiro dar solavancos.
Na realidade
só há um centro, não só como doutrina, mas na prática – Cristo e a Trindade. O
que o Deus ´que está i tem a dizer sobre si próprio? logo que respondemos a
essa pergunta e vivemos na base da resposta, tudo se encaixa no lugar, como um
guarda-roupa belamente organizado ou uma linda seleção de música de Bach, em
que cada voz tem seu lugar.
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Extraído do livro "Não há gente sem importância". p.159.
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