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19 de ago. de 2015

O Propósito do Shabbath: Descanso ou Descanso Espiritual?

 
Por Alan Rennê Alexandrino

Um ponto que é essencial para a nossa compreensão acerca do dia do Senhor é entendermos qual é, exatamente, a natureza do descanso que nos é ordenado e providenciado pelo Senhor em seu dia. Isso envolve compreendermos se o domingo é um dia meramente voltado para o descanso físico, para o recompor das energias ou até mesmo para o ócio, a fim de enfrentarmos mais uma semana de trabalho, voltado para o descanso e o lazer com a família[i], ou se o domingo é um dia voltado para o descanso espiritual, isto é, para a devoção mais íntima, mais focada em Deus juntamente do povo de Deus.

Há alguns anos, quando estava ensinando a respeito do dia do Senhor houve quem protestasse dizendo ser o domingo o único dia que tinha para ir à praia e fazer um churrasco com a família. Eu acredito que não são poucas as pessoas que possuem este raciocínio, que entendem que o propósito do dia do Senhor é tão somente proporcionar o descanso, o repouso e o lazer necessários após uma estressante e estafante semana de trabalho, afinal de contas, no mandamento o Senhor Deus nos diz: “não farás nenhum trabalho, nem tu, nem o teu filho, nem a tua filha, nem o teu servo, nem a tua serva, nem o teu animal, nem o forasteiro das tuas portas para dentro” (Êxodo 20.10). Ao mencionar os servos e os animais se vê claramente que o dia de descanso tem em vista o descanso e o refazer do vigor e das forças. No entanto, a questão é: É apenas isso? O único propósito do dia do Senhor é proporcionar ao trabalhador um momento para dormir até mais tarde, ir à praia com a família, fazer um piquenique, etc?

Esta questão é de grande importância, pois como salienta o Pr. Ryan McGraw, pastor da Igreja Presbiteriana da Graça, em Conway, na Carolina do Sul:

O cerne do debate sobre o que é lícito no Shabbath é se o propósito do dia é descansar ou se é descansar “empregando todo o tempo em exercícios públicos e particulares de adoração a Deus” (Breve Catecismo de Westminster, P. 60). A maneira como você responde a esta pergunta determina como você observará o dia. Este ponto determina como você responderá a cada pergunta a respeito de quais pensamentos, palavras e obras são apropriados no Shabbath, bem como se recreações seculares que são lícitas nos outros dias também são lícitas no Shabbath. Se você crê que o propósito do dia é descansar, então a ênfase da sua guarda do Shabbath estará sobre aquilo que faz com que você se sinta mais descansado. Por outro lado, se você acredita que o propósito do Shabbath é consagrar um dia para o culto privativo, familiar e público, então você excluirá todas as práticas que são inconsistentes com o culto ou que não o promovem de forma imediata.[ii]

Por aquilo que as Escrituras revelam fica claro que o propósito do dia do Senhor não é apenas proporcionar descanso físico ao seu povo após uma semana de trabalho intenso. O descanso do dia do Senhor não pode ser igualado a inatividade ou ócio. No início da letra do quarto mandamento encontramos um indício de como o dia deve ser compreendido: “Lembra-te do dia de sábado, para o santificar” (Êxodo 20.8). Devemos atentar para o fato de que o descanso do Shabbath é um descanso santo. O dia deve ser santificado. Todos nós sabemos que quando algo é santificado isso significa dizer que o mesmo é retirado do seu uso comum para servir a um fim religioso ou piedoso. Quando algo é consagrado isso significa dizer que é separado por Deus para ele mesmo, para a fruição do próprio Deus, para o deleite e o agrado dele. A mesma ideia aparece, por exemplo, em Êxodo 31.15-17: “Seis dias se trabalhará, porém o sétimo dia é o sábado do repouso solene, santo ao SENHOR; qualquer que no dia do sábado fizer alguma obra morrerá. Pelo que os filhos de Israel guardarão o sábado, celebrando-o por aliança perpétua nas suas gerações. Entre mim e os filhos de Israel é sinal para sempre; porque, em seis dias, fez o SENHOR os céus e a terra, e, ao sétimo dia, descansou, e tomou alento”. Assim, vejam que o dia é declarado um dia santo.

Além disso, está escrito em Êxodo 35.1-2: “Tendo Moisés convocado toda a congregação dos filhos de Israel, disse-lhes: São estas as palavras que o SENHOR ordenou que se cumprissem: Trabalhareis seis dias, mas o sétimo dia vos será santo, o sábado do repouso solene ao SENHOR; quem nele trabalhar morrerá”. Permitam-me citar também as palavras de um pastor presbiteriano chamado Robert L. Reymond a respeito da natureza do dia do Senhor como um “repouso solene”:

Nesta passagem é importante notar o significado da palavra “repouso” e as palavras seguintes “ao SENHOR”. “Repouso” não pode significar mera cessação de trabalho, muito menos recuperação da fadiga. Essa ideia também não é aplicável ao “descanso” de Deus em Gênesis 2.2-3. A primeira ideia é negada por nosso Senhor em João 5.17 onde ele afirma que o “Pai trabalha até agora”. A última é inapropriada à ideia de quem Deus é. “Repouso” significa o envolvimento numa nova atividade, no sentido de uma atividade diferente. Significa a cessação do labor dos seis dias e a tomada de diferentes labores apropriados ao dia do Senhor. O que esses labores do repouso do Sabbath são está circunscrito pela frase acompanhante “ao SENHOR”. Eles certamente incluem tanto o culto corporativo quanto o privado e a contemplação da glória de Deus.[iii]

Isso fica ainda mais claro quando observamos a posição do quarto mandamento no Decálogo. Essa posição coloca uma forte ênfase sobre a ideia de culto. Os primeiro quatro mandamentos tratam da nossa relação direta com Deus de modo geral e, mais especificamente, do culto que devemos prestar a ele. O primeiro mandamento trata do objeto de culto, o segundo da maneira do culto, o terceiro da atitude apropriada do culto, e o quarto do tempo separado exclusivamente para o culto.

O puritano Lewis Bayly, em sua obra A Prática da Piedade, uma obra que influenciou a ninguém menos que John Bunyan, autor da famosa obra O Peregrino, disse o seguinte: “Aquele que observa o Shabbath só descansando do seu trabalho comum, observa-o como qualquer animal. Mas a guarda desse dia como descanso é ordenada aos cristãos igualmente como ajuda à santificação. Assim também o trabalho é proibido por impedir o culto exterior e interior de Deus”.[iv]
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[i] Na mente de muitas pessoas este é o único propósito do domingo. O dia foi estabelecido para ser aproveitado em família. Nesse caso, há uma dissociação do propósito intentado por Deus.

[ii] Ryan M. McGraw. The Day of Worship: Reassessing the Christian Life in Light of the Sabbath. Grand Rapids, MI: Reformation Heritage Books, 2011. pp. 25-26.

[iii] Robert L. Reymond. “Lord’s day Observance”. In: Contending for the Faith: Lines in the Sand that Strengthen the Church. Ross-shire: Christian Focus Publications, 2005. p. 181.

[iv] Lewis Bayly. A Prática da Piedade. São Paulo: PES, 2010. p. 265.

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