Por Michael Lawrence
Você já se sentou em uma sala de
aula pensando qual era o objetivo? Eu distintamente me lembro de sentir isso
enquanto sofria durante as aulas de cálculo na faculdade. O curso era
ministrado como se a aplicação dos princípios fossem autoevidentes. E talvez
para os amantes da matemática na classe fossem. Mas para esse estudante de
literatura inglesa, era um exercício constante de reflexão puramente abstrata
e uma derrota. Sem entender o verdadeiro mundo de aplicação, eu tinha
dificuldade em entender porque precisava saber o valor de alguma coisa enquanto
esta se aproximava do infinito, sem nunca realmente alcançar .
E se você foi um gênio em
matemática, simplesmente se lembre de como você se sentia quando pediam para
discutir o significado dos sonetos de Shakespeare.
Explicação é diferente de
Aplicação
Eu não estou tentando desenterrar
memórias antigas. Mas me pergunto se alguns de nós pregadores não somos
culpados de colocar os membros de nossa igreja numa posição equivalente ao de
um estudante de primeiro ano de cálculo ou literatura a cada domingo? Como
muitos professores em muitos campos, estamos apaixonados sobre o que
ensinaremos e extremamente bem preparados. Nós podemos responder perguntas
sobre tempos verbais de Grego e Hebraico e o pano de fundo histórico e cultural
do Oriente Médio. Podemos destacar um quiasmo antes que nosso povo possa pensar
sobre como se pronuncia a palavra. E estamos preparados para explicar porque os
tradutores entenderam errado e, ao invés, deveriam seguir a nossa
interpretação.
E mesmo assim com toda essa
riqueza de conhecimento e compreensão, entregue com paixão e de grande
importância, nossa congregação fica com pouco entendimento do que deve fazer
com isso. Eles sabem que é importante – porque é a Palavra de Deus. Mais do que
isso, eles sabem que é a Palavra de Deus dada para eles. Dito isso, nós
essencialmente lhes dizemos : “Agora está com você. Você agora terá que
descobrir como aplicar por conta própria.” Ou pior, nós deixamos as pessoas um
pouco constrangidas e com um sentimento de fracasso espiritual por não saberem
como aplicar o que ouviram, já que parece tão óbvio para nós.
Não é suficiente para nós
pregadores simplesmente explicar o texto à nossa congregação. Se seremos bons
pastores, temos que aplicar o texto a suas vidas nos dias atuais.
Então por que não fazemos? Eu
consigo pensar em algumas razões.
Primeiro, aplicação é trabalho
duro. Comparado a pensar a complexidade do coração humano e sua condição,
analisar gramática e contexto é brincadeira de criança.
Segundo, aplicação é subjetiva.
Eu sei quando defini uma sentença corretamente, ou analisei um verbo. Mas como
eu posso saber se acertei na aplicação?
Terceiro, aplicação é complexa. O
texto tem um ponto principal. Porém, existem múltiplas aplicações, talvez tanto
quanto existem ouvintes. Escolher entre as muitas opções é desafiador.
Quarto, aplicação é pessoal.
Assim que começo a pensar sobre como o texto se aplica a minha congregação, não
consigo deixar de ser confrontado com a aplicação dele para mim. E algumas
vezes, eu preferia só explicá -lo a ter que lidar com ele.
Todas estas razões têm a ver com
a nossa própria carne e nosso desejo ou de evitar o trabalho duro no qual não
somos bons ou evitar completamente convicções pessoais. E nossa resposta a
essas desculpas deve simplesmente ser arrepender-se.
Aplicação é diferente de
Convicção
Mas existe uma quinta razão, mais
teológica, para alguns de nós negligenciarmos a aplicação em nossos sermões.
Estamos convencidos que a aplicação é o trabalho de outro e está além daquilo
que recebemos para fazer. “Não é o Espírito Santo quem deve aplicar o texto ao
coração de uma pessoa? Se eu aplicá -lo e não for aplicável, não ficarão com a
impressão que estão isentos de responsabilidade? Mas se eu expor a verdade e
sair da frente, então o Espírito Santo tem um caminho livre para fazer sua
obra. E ele fará melhor do que eu farei de qualquer forma.”
Eu já ouvi mais de um pregador
respeitado de nossos dias defender tal ponto. Mas com todo respeito, penso que
esta objeção é não-bíblica e teologicamente confusa. O erro é confundir
convicção com aplicação. Convicção de pecado, justiça e juízo é o trabalho do
Espírito Santo (João 16.8). Ninguém a não ser o Espírito Santo pode trazer
verdadeira convicção e quando tentamos fazer o trabalho dele inevitavelmente
caímos em legalismo. Por quê? Porque convicção é um assunto do coração, no qual
uma pessoa não é só convencida de que algo é verdadeiro, mas também de que deve
prestar contas a Deus sobre essa verdade e deve agir a partir dela.
Aplicação é diferente de
convicção. Apesar de seu alvo ser o coração, está direcionada para a
compreensão. Se a exegese requer de nós a compreensão do contexto original do
texto, a aplicação se trata somente de explorar o contexto contemporâneo onde o
texto é ouvido. Trata-se de identificar categorias de vida, ética e
entendimento nas quais tal palavra de Cristo em particular precisa habitar ricamente
(Colossenses 3.16). Todos temos a tendência de ouvir por meio de nossos
próprios filtros e de nossas próprias experiências. Então, quando um pastor se
esforça para aplicar a Palavra, existe uma oportunidade para que consideremos a
importância de certa passagem de formas que nunca tenhamos feito antes, ou não
que normalmente não consideraríamos .
Então, por exemplo, sempre que
ouço João 3.16, eu imediatamente penso sobre meu chamado para o evangelismo.
Esta é minha aplicação natural, quase uma reflexão pessoal desse verso. Mas
uma aplicação homilética mais cuidadosa pode me causar a pensar mais
profundamente sobre a natureza do amor de Deus por mim ou o que significa ter
vida eterna em Cristo. Ao expandir minha compreensão da possível aplicação deste
único verso, João 3.16 começa a habitar muito mais ricamente em minha vida.
Mais do que invadir a esfera de trabalho do Espírito Santo, uma boa aplicação
multiplica as oportunidades de convicção.
Evitar a aplicação não é bíblico
Evitar a aplicação é também
simplesmente antibíblico. Aplicação é exatamente o que vemos os pregadores e
mestres da Palavra de Deus fazendo nas páginas das Escrituras. Desde
Deuteronômio 6.7 – onde é dito aos pais, “inculcarás [estes mandamentos] a seus
filhos” – até Neemias 8.8 – onde Esdras e os Levitas não somente leram o Livro
da Lei para o povo, mas se esforçaram “dando explicações, de maneira que
entendessem o que se lia” – o Antigo Testamento mostra preocupação que o povo
de Deus não só conheça sua Palavra, mas entenda seu significado para suas
vidas.
E essa preocupação continuou nos
ensinamentos de Jesus e dos apóstolos. Em Lucas 8.21, Jesus confirma sua
relação com aqueles que “ouvem a palavra de Deus e a praticam” e seus
ensinamentos estão cheio de exemplos de como seria colocar esta palavra em
prática, começando com o Sermão do Monte. As cartas dos apóstolos estão cheias
de aplicações práticas, e eles passaram tal preocupação aos presbíteros, os
quais deveriam ensinar piedade na prática (1 Timóteo 4) e confiar este mesmo
ensinamento “a homens fiéis e também idôneos para instruir a outros” (1 Timóteo
2.2).
Em nenhum lugar vemos isto mais
claramente do que em Efésios 4.12-13. O propósito dos pastores e mestres como
dons de Cristo para a igreja é o “aperfeiçoamento dos santos para o desempenho
do seu serviço, para a edificação do corpo de Cristo”. Como podemos preparar
membros da igreja para seus diversos ministérios dentro ou fora da igreja se
não falamos de forma específica e prática para tal finalidade? Paulo parece presumir
que ao invés de evitar a aplicação, é justamente nessa direção que deveríamos
constantemente apontar.
Alguns exemplos
Então, com o que isso se
pareceria na prática? Deixe- me oferecer dois exemplos. Primeiro, considere 2
Samuel 11, a narrativa do adultério de Davi com Bate-Seba e o abuso de poder
para conspirar um homicídio e encobrir seu pecado. Obviamente, as aplicações
sobre pureza sexual e homicídio estão bem na superfície do texto. Mas o que
dizer às pessoas da sua congregação para as quais adultério e homicídio não são
tentações no momento? Eu tenho certeza que existem alguns. Não há nada mais
para dizer para eles? É claro que existe.
Olhando para o pecado específico
de Davi, você pode ajudá-los a ver o padrão do pecado de forma geral, sua
natureza enganadora, oportunista e progressiva. Então poderá ajudá -los a
pensar sobre os “pecados de oportunidade” que eles enfrentam, não como o rei de
Israel, mas como mães e avós, estudantes e os que trabalham em escritórios,
gerentes e aposentados. Em sua aplicação, você não está tentando ser exaustivo.
Você está tentando ajudá-los a compreender o sentido da passagem e fazer as
engrenagens girarem em suas próprias mentes sobre suas vidas.
Ou considere Efésios 6.1-4. Esta
é uma passagem sobre as obrigações mútuas de pais e filhos. E existem muitas
aplicações bem claras. Mas o que dizer à s pessoas na sua igreja que não tem
filhos, ou não tem mais filhos em casa? Eles devem somente ouvir e esperar
aprender alguma coisa para que possam encorajar os pais a sua volta? Isto é um
começo. Mas esta é a Palavra de Deus para eles também. O princípio de
autoridade corretamente exercido é aplicável a todos nós. Professores e alunos,
empregadores e empregados, presbíteros e congregação todos têm algo a aprender
sobre o que significa prosperar através e debaixo de autoridade piedosa. Como o
Catecismo Maior de Westminster destaca que “no quinto mandamento, abrangem não
somente os próprios pais, mas também todos os superiores em idade e dons,
especialmente todos aqueles que, pela ordenação de Deus, estão colocados sobre
nós em autoridade” (Resposta 124). Todos estamos debaixo de alguma esfera de
autoridade e muitos de nós exercem autoridade em outra esfera. Uma aplicação
atenciosa deixará isso claro.
O que isto significa para você
O que tudo isto significa, eu
acredito, é que um sermão não aplicado não é um sermão, mas meramente uma
palestra bíblica. Nós não queremos pessoas saindo de nossas pregações
imaginando qual era o ponto central. Ao invés, vamos nos dedicar a aplicação do
texto, “para a edificação do corpo de Cristo... à medida da estatura da
plenitude de Cristo”.
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Fonte: Ministério Fiel
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