Paul Washer
O evangelho de Jesus Cristo
é o maior de todos os tesouros dados à igreja e ao cristão como indivíduo. Não
é uma mensagem entre muitas, mas a mensagem acima de todas as outras. É o poder
de Deus para a salvação e a maior revelação da multiforme sabedoria de Deus aos
homens e aos anjos. É por essa razão que o apóstolo Paulo deu primazia ao
evangelho em sua pregação, esforçando-se com tudo que tinha para proclamá-lo
com clareza, pronunciando até mesmo uma maldição sobre todos que pervertessem
sua verdade.
Cada geração de cristãos,
pelo poder do Espírito Santo, é responsável pela mensagem do evangelho. Deus
nos chama a guardar este tesouro que nos foi confiado. Se quisermos ser fiéis
mordomos, teremos de estar absorvidos no estudo do evangelho, tomando grande cuidado
para compreender as suas verdades, comprometendo-nos a guardar o seu conteúdo.
Ao fazê-lo, garantimos nossa salvação, bem como a salvação daqueles que nos
ouvem.
Como sabemos comumente, a
palavra Evangelho vem do vocábulo grego euangélion, que é traduzida como “boas
novas”. Num sentido, toda página da Escritura contém o evangelho, mas em outro
sentido, ele se refere a uma mensagem muito específica — a salvação realizada
para um povo caído, por meio da vida, morte, ressurreição e ascensão de Jesus Cristo,
o Filho de Deus.
Conforme o bom prazer do
Pai, o Filho eterno, que é um com o Pai e a exata representação de sua
natureza, deixou voluntariamente a glória do céu, foi concebido pelo Espírito
Santo no ventre de uma virgem, e nasceu o homem-Deus: Jesus de Nazaré. Como
homem, ele andou sobre a terra em perfeita obediência à lei de Deus. Na
plenitude do tempo, os homens rejeitaram-no e o crucificaram. Sobre a cruz, ele
carregou o pecado do homem, sofreu a ira de Deus, e morreu no lugar do homem.
Ao terceiro dia, Deus o ressuscitou da morte. Esta ressurreição é a declaração
divina de que o Pai aceitou a morte de seu Filho como sacrifício pelo pecado.
Jesus pagou a penalidade pela desobediência do homem, satisfez as demandas da
justiça e aplacou a ira de Deus. Quarenta dias após a ressurreição, o Filho de
Deus ascendeu ao céu e se assentou à destra do Pai, e foi-lhe dada glória
honra, e domínio sobre todas as coisas. Ali, na presença de Deus, ele
representa seu povo e intercede junto a Deus em seu favor. Deus perdoará
plenamente a todos quantos reconhecem seu estado de pecado e incapacidade, e se
lançam sobre Cristo, sendo por ele declarados justos e reconciliados a ele.
Este é o evangelho de Deus e de Jesus Cristo, seu Filho.
Um dos maiores crimes
cometidos pela presente geração de cristãos é a negligência do evangelho, e é
devido a essa negligência que nascem todos os nossos outros males. O mundo
perdido não é tão endurecido quanto é ignorante do evangelho, porque muitos que
proclamam sua mensagem também ignoram suas verdades mais básicas. Os temas
essenciais que compõem o próprio cerne do evangelho — justiça de Deus,
depravação total do homem, expiação pelo sangue, a natureza da verdadeira
conversão, e a base bíblica para a segurança da salvação — estão demasiadamente
ausentes dos púlpitos atuais. As igrejas reduzem a mensagem do evangelho a
algumas declarações do credo, ensinam que a conversão é apenas uma decisão
humana e pronunciam a segurança da salvação para qualquer um que tenha feito a
“oração do pecador”.
O resultado desse
reducionismo evangélico tem sido de longo alcance. Primeiro, endurece ainda
mais o coração dos não convertidos. Poucos “convertidos” dos dias modernos
entram na comunhão da igreja, e os que o fazem, muitas vezes, se desviam ou têm
as vidas marcadas pela carnalidade habitual. Milhões sem conta andam por nossas
ruas e se assentam, não transformados pelo verdadeiro evangelho de Jesus
Cristo. No entanto, estão convencidos de sua salvação, porque em dado momento
de sua vida levantaram a mão em uma campanha evangelística ou repetiram uma
oração aceitando Jesus. Esse falso senso de segurança cria uma grande barreira
que, frequentemente, isola estes indivíduos de ouvir o verdadeiro evangelho.
Em segundo lugar, tal
evangelho deforma a igreja, fazendo com que, em vez de ser um corpo espiritual
de crentes regenerados, seja um ajuntamento de homens carnais, que professam
conhecer a Deus, mas o negam por suas obras. Com a pregação do verdadeiro
evangelho, os homens chegam à igreja, sem o entretenimento evangélico,
atividades especiais ou promessas de benefícios além daqueles realmente
oferecidos pelo evangelho. Aqueles que vêm o fazem porque desejam a Cristo e
tem fome da verdade bíblica, adoração de coração e oportunidades de servir.
Quando a igreja proclama um evangelho menor que isso, ela se enche de homens
carnais, que compartilham pouco interesse pelas coisas de Deus. Manter tais
pessoas é um fardo pesado para a igreja. A igreja então diminui o nível das
demandas radicais do evangelho para uma moralidade conveniente, e a verdadeira
dedicação a Cristo cede a atividades projetadas para suprir as necessidades
sentidas pelos seus membros. A igreja torna-se dirigida por atividades ao invés
de ser centrada em Cristo, e cuidadosamente filtra ou faz novo pacote da
verdade, a fim de não ofender a maioria carnal. A igreja deixa de lado as
grandes verdades da Escritura e do cristianismo ortodoxo, e o pragmatismo (ou
seja, aquilo que mantém a igreja em movimento e crescimento) se torna a regra
do dia.
Em terceiro lugar, um
evangelho desse tipo reduz o evangelismo a pouco mais que um esforço humanista
dirigido por estratégias de marketing sagazes, baseadas nas últimas tendências
da cultura. Após anos testemunhando a impotência de um evangelho não bíblico, muitos
evangélicos parecem convencidos de que ele não vai dar certo, e que o homem de
alguma maneira tornou-se um ser complexo demais para ser salvo e transformado
por mensagem tão simples e escandalosa. Hoje em dia há maior ênfase em entender
nossa cultura decaída e seus modismos do que compreender e proclamar a única
mensagem que tem o poder de salvá-la. Como resultado, o evangelho é
constantemente reapresentado, de forma a caber na caixinha do que a cultura
contemporânea considera mais relevante. Esquecemos que o verdadeiro evangelho
sempre é relevante a toda cultura porque é a palavra eterna de Deus para todo
homem.
Em quarto lugar, um
evangelho assim traz repreensão ao nome de Deus. Uma proclamação diluída do
evangelho faz com que os carnais e não convertidos entrem na comunhão da
igreja, e pela negligência quase que total do que seja uma igreja bíblica, é
permitido que eles permaneçam sem correção ou repreensão. Isso mancha a pureza
e reputação da igreja e é blasfêmia ao nome de Deus entre os incrédulos. No
final, Deus não é glorificado, a igreja não é edificada, os membros não
convertidos na igreja não são salvos, e a igreja tem pouco ou nenhum testemunho
ao mundo descrente.
Não fica bem a nós,
ministros ou leigos, estarmos tão próximos, vendo “o glorioso evangelho de
nosso bendito Deus” substituído por um evangelho de menor glória, e não
fazermos nada sobre isso. Como mordomos desta verdade, temos o dever de
recuperar o único evangelho verdadeiro e proclamá-lo com ousadia e clareza a
todos. Faríamos bem em atender as palavras de Charles Haddon Spurgeon:
Nestes dias, sinto-me
impelido a voltar repetidamente às verdades elementares do evangelho. Em tempos
de paz, talvez sintamos liberdade de fazer excursões aos interessantes
distritos da verdade que se encontram em campos distantes; mas agora precisamos
manter-nos em casa, guardando os corações e lares da igreja, defendendo os
primeiros princípios da fé. Na era presente, tem surgido na própria igreja,
homens que falam coisas perversas. Há muitos que nos perturbam com suas
filosofias e novas interpretações, com as quais negam as doutrinas que
professam ensinar, solapando a fé que têm compromisso de manter. É bom que
alguns de nós, que sabemos no que cremos, e não forjamos significados secretos
para nossas palavras, simplesmente batamos o pé e nos recusemos a tanto,
apresentando a palavra da vida, e declarando claramente as verdades
fundamentais do evangelho de Jesus Cristo.
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Fonte: Trecho do Livro
“Chamado ao Evangelho e a Verdadeira Conversão”, do autor Paul Washer,
lançamento da Editora Fiel de março.
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