“E dizia a todos: Se
alguém quer vir após mim, negue-se a si mesmo, e tome cada dia a sua cruz, e
siga-me”.
Lucas
9.23
O Ego é o nosso “eu”, a
nossa essência. Levando em conta os efeitos do pecado de Adão em toda a espécie
humana, podemos afirmar que o ego foi afetado e tornou-se corrompido,
desfigurando a imagem de Deus que havia no homem original. Sendo assim, o ego
naturalmente nos transmite uma ideia ensimesmada de nós mesmos. Ele encontra-se
inchado e esse inchaço faz com que ele seja oco e delicado.
Por isso, a porta de
entrada para salvação começa com a mortificação do ego (ler Gl 2.20, Rm 6.6).
Quando Cristo nos diz que para segui-lo temos que carregar uma cruz - e isso
diariamente - devemos lembrar que todo o homem que carregava o madeiro estava
indo para a morte. Estar disposto a morrer todos os dias é justamente renunciar
os caprichos do nosso ego. A renúncia da autossatisfação é necessária para todo
aquele que recebeu a salvação mediante a graça e foi incluído no Corpo de
Cristo, isto é, a Igreja. Se vivemos segundo os ditames do Evangelho e o nosso
ego continua inflado, os resultados não serão nada bons para a vida em
comunidade.
A dilatação do ego causa
desconforto, tal como um órgão de nosso corpo quando está inchado. Ele é frágil
e, na tentativa de camuflar sua fragilidade, trabalha traçando comparativos com
outras pessoas. Como bem observou C.S. Lewis:
“Dizemos
que as pessoas se orgulham de serem ricas, espertas, ou bonitas, mas isso não é
verdade. Elas têm orgulho de serem mais ricas, mais espertas ou mais bonitas
que os outros. Se todos fossem igualmente ricos, ou inteligentes, ou bonitos,
não existiria motivo de orgulho”.
Imagina esse tipo de
competitividade movida pela altivez no ambiente eclesiástico. O entrave em
estabelecer comunhão se dará na medida em que enxergo meu semelhante em Cristo
como um rival, onde tenho que superá-lo em diversas áreas. Isso gera um
espírito faccioso que não deve existir entre os santos que formam a Igreja.
Vemos isso claramente entre os irmãos de Coríntios. O apóstolo Paulo sabia que
o motivo de tanta desunião era resultante de um ego inchado (1Co 4.18 e 5.2).
Os coríntios gostavam de se vangloriarem uns com os outros, e por isso são
exortados - por Paulo - a abandonarem essa postura (1Co 4.6).
Uma visão superestimada de
nós mesmos compromete a realidade dos fatos e causa ilusão até mesmo em nossa
espiritualidade. A Igreja de Laodiceia se orgulhava por ser rica e dizia não
ter falta de nada, todavia, aquela igreja era - segundo as palavras do SENHOR:
desgraçada, miserável, pobre, cega e nua (Ap 3.17). De igual modo, os fariseus tinham uma imagem
distorcida de si e não se davam conta de que não eram tidos como justos diante
de Deus. Isso está bem nítido na parábola que se encontra em Lucas 18.9-14.
Para termos plena comunhão
com Deus e com a Igreja, faz-se necessário tomar o exemplo de Cristo e ter o
mesmo sentimento que ele teve. Em Filipenses 2.5-8, o apóstolo Paulo ensina
que Jesus, mesmo sendo igual a Deus, aniquilou a si mesmo, ou em outras
palavras, esvaziou-se e assumiu a forma humana e a postura de servo. Sua
obediência e humildade fizeram com que o mesmo fosse morto na cruz, como se ele
fosse um criminoso. Vale ressaltar que este caminho trilhado pelo nosso SENHOR
foi o oposto que fez Satanás e o primeiro casal no Éden. Estes últimos foram
seduzidos a comerem do fruto para tornarem-se semelhantes a Deus (leia o relato
da Queda em Gn 3).
Se nós somos cristãos de
fato, temos que imitar a Cristo em tudo. Sendo assim, humildade se torna
pré-requisito para termos a nossa cidadania celestial. Sobre sermos humildes,
Tim Keller escreve:
“A
pessoa verdadeiramente humilde não é aquela que se odeia ou se ama, e sim a que
tem a humildade do Evangelho. É uma pessoa que se esquece de si mesma e cujo
ego é igual aos dedos dos pés. Eles simplesmente exercem sua função. Não
imploram por atenção”.
Este é o grande segredo:
pensar cada vez menos sobre mim e mirar o meu olhar no outro. Em Romanos 12.10
diz que devemos dar honra aos outros e não procurar honrar a nós mesmos. Isso
nivela por cima os relacionamentos na Igreja, pois, se cada irmão focar em
zelar pela vida do seu próximo, todos serão bem assistidos em matéria de amor
fraternal e ninguém se sentiria desprezado ou desconfortável, a não ser que
essa pessoa sofresse de algum transtorno afetivo.
Viver os padrões do
cristianismo é algo libertador. Se adotássemos a humildade que o evangelho requer
de nós, tudo seria mais belo e prazeroso. Nos alegraríamos mais com as
conquistas alheias ao invés de sentirmos inveja e nos cobrarmos para chegar no
mesmo patamar do outro. Não nos frustraríamos por não alcançarmos as mesmas
metas do nosso próximo, pois não competimos com ele. Viver assim é abandonar um
fardo que tanto nos incomoda. Deixemos o Evangelho nos libertar da tirania da
vaidade competitiva.
Cada um de nós, por ainda
conter uma natureza carnal, precisa andar em vigilância. Todos, em maior ou
menor grau temos problemas com nosso ego. O orgulho é um dos pecados mais sutis
e mais comuns. Lembremos de que tomar a cruz é um exercício diário. É uma luta
que travamos com Narciso. Precisamos vencê-lo, mas a nossa vitória está em
Cristo Jesus. A nossa força vem do alto. Por isso, tomemos o seguinte trecho do
Salmo 139 e façamos dele nossa oração:
“Sonda-me, ó Deus, e
conhece o meu coração; prova-me os pensamentos; vê se há em mim algum caminho
mau e guia-me pelo caminho eterno”.
Salmo
139.23-24
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O Livreto “Ego
Transformado” de Timothy Keller foi utilizado como referencial teórico para
este artigo e as duas citações que faço foram extraídas dele. Recomendo esta
obra de leitura breve, simples e impactante.
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