Por Pedro Pamplona
A teologia da prosperidade já apanhou demais. Seus
grandes ícones já foram expostos e desmascarados. Infelizmente ela ainda faz
vítimas pela falta de conhecimento do povo, principalmente nas periferias,
público alvo desse tipo de “teólogos”. Felizmente ela está cada vez mais
marginalizada e ficando limitada a determinadas igrejas. Um bom números de
crentes tem um grande repúdio por esse tipo de abordagem “evangélica”. Pois
bem, eis que temos uma substituta para a tal da teologia da prosperidade (TP).
Eu a chamo de teologia do coaching (TC). Usareis as siglas a partir de agora.
A Cultura do Coaching
Sou formado em administração. Cursei quatro anos de
faculdade e fiz outros cursos na área. Na época o coaching não era tão
conhecido como hoje. Sempre valorizei cursos com conteúdos práticos como
finanças, marketing e recursos humanos. Nunca fomos ensinados que precisaríamos
de pessoas nos acompanhando para ensinar, direcionar, motivar e cobrar. Nós
mesmos faríamos isso. Então a cultura do coaching chegou. Vá a uma seção de
administração e negócios de uma livraria hoje e você perceberá o que estou
dizendo. Nunca me dei bem com ela para ser sincero. E quero explicar a razão
usando duas citações do Instituto Brasileiro de Coaching. Primeiro, o que é o
coaching?
“Um mix de recursos
que utiliza técnicas, ferramentas e conhecimentos de diversas ciências como a
administração, gestão de pessoas, psicologia, neurociência, linguagem
ericksoniana, recursos humanos, planejamento estratégico, entre outras visando
à conquista de grandes e efetivos resultados em qualquer contexto, seja
pessoal, profissional, social, familiar, espiritual ou financeiro”¹
Agora pergunto: como o coaching acontece?
“Conduzido de
maneira confidencial, o processo de Coaching é realizado através das chamadas sessões,
onde um profissional chamado Coach tem a função de estimular, apoiar e
despertar em seu cliente, também conhecido como coachee, o seu potencial
infinito para que este conquiste tudo o que deseja”²
Antes de continuar deixe-me dizer algo para que fique
claro. Acredito na liberdade de trabalho honesto. Se você gosta ou trabalha
honestamente com isso, ok, é a sua escolha. Por mais que eu tenha críticas a
essa prática, aqui entrarei na relação do coaching com a igreja. Usarei essas
duas respostas dadas para analisar biblicamente o que chamo de TC. Minha
argumentação será essa: Igreja e evangelho não combinam com o coaching e não
devem se misturar jamais. Quando isso acontece temos uma nova TP com uma
roupagem mais humanista e existencialista.
Junto com o coaching cresceu o chamado
empreendedorismo de palco (EP). São aqueles profissionais que trabalham com
palestras motivacionais e grandes palestras de coaching. Esse mercado tem
crescido assustadoramente e também tenho sérias dificuldades com ele. Aqui se aplica
a mesma observação que fiz aos profissionais de coaching. Mesmo assim indico um
ótimo texto escrito por Ícaro de Carvalho chamado Por que o empreendedorismo de
palco irá destruir você. O autor começa com uma afirmação que capta bem o ponto
onde quero chegar:
“O
empreendedorismo é a nova religião do homem moderno. Materialista e secular,
ele substituiu os Santos do seu altar por fotografias de homens bem sucedidos;
os seus Evangelhos são livros como “O sonho grande” e “A força do Hábito”. Ele
acredita, de alguma maneira, que tudo aquilo irá aproximá-lo do seu objetivo
principal: sucesso, fama e dinheiro…de preferência agora!”³
Essa cultura construída em torno do coaching e do
EP é em sua maioria materialista. O objetivo de muitos é o sucesso financeiro,
e isso significa enriquecer. Com um fator especial: o mais rápido possível. É
comum ler e ouvir grandes promessas e ensinamentos sobre como trabalhar menos e
ganhar mais. O foco está no esforço intelectual e físico daquele que está
buscando seu lugar ao sol. É dessa cultura de palco, sonhos, riquezas e
promessas que estou falando. Já viu onde isso vai chegar na igreja? Vamos falar
disso agora!
O Coaching na Igreja
Eu já vi palestras de coaching acontecendo onde
deveria haver uma pregação da Palavra. Isso mesmo, em pleno culto público.
Infelizmente essa cultura chegou em muitas igrejas. E se eu já não me dou bem
com ela no mercado de trabalho, na igreja não tenho medo de dizer que ela é
minha inimiga. Assim como repudio a TP também o faço com essa nova onda da TC.
Em alguns sentidos essa segunda chega a ser pior do que a primeira. Vamos
analisar três pontos que constroem a TC.
Humanismo: O coaching utiliza de técnicas humanas
num indivíduo que é o centro de tudo para que este alcance seus objetivos
humanos. Muitos pastores e líderes tem enveredado por esse caminho. Tratam suas
pregações como palestras motivacionais da fé que confundem fé com força e
vontade, evangelho com motivacionismo e Cristo com um palestrante. O foco está
naquilo que o homem pode fazer através da sua fé pessoal. Fé essa que passa por
Cristo, mas que tem seu objeto na própria pessoa e nos seus esforços dirigidos.
Muitas “pregações” tem o mesmo objetivo do coaching, ou seja, estão “visando à
conquista de grandes e efetivos resultados em qualquer contexto, seja pessoal,
profissional, social, familiar, espiritual ou financeiro”. O apelo pode ser até
espiritual, mas ainda assim Você já deve ter escutado muito coisas do tipo
“como ser o melhor marido”, “como atrair e fidelizar pessoas para o reino”,
“alcançando sucesso através da fé.”. Tudo isso travestido de espiritualidade…
Materialismo: há um desejo enorme em conquistar
coisas. Sejam elas produtos do mercado como carros, casas, roupas, viagens ou
algo mais “espiritual” como paz, pessoas, bom casamento, filhos educados,
castidade, etc. As pessoas querem conquistar, possuir e avançar, sendo tudo
isso fruto não da humilhante auto confrontação e negação de si mesmo, mas da
auto-afirmação. O papel do pastor se tornou muito parecido com o do coach:
“estimular, apoiar e despertar em seu cliente (ovelha)… o seu potencial
infinito para que este conquiste tudo o que deseja”. É exatamente isso que essa
mistura humanista-materialista busca: o potencial infinito de cada ser humano
para conquistar aquilo que ele deseja. Há uma conexão com o existencialismo,
onde o indivíduo e sua busca pessoal por significado em si mesmo passa a ser o
centro do pensamento filosófico.
Ceticismo: Humanismo e materialismo são marcas de
seres céticos. A crença no Deus da Bíblia é cada vez mais fraca onde esse tipo
de cultura se manifesta. Como eu já disse, a TC busca descobrir o potencial de
cada pessoas para que ela alcance seus próprios objetivos. Dependência de Deus
é algo apenas fantasiado. Orações são feitas apenas para que Deus abençoe
nossos planos e para que Ele nos dê apoio em nossa própria empreitada. O
sobrenatural é esquecido e Deus vai ficando cada vez mais distante. Na TC o
soberano é o indivíduo com suas decisões de fé e sucesso. Em muitas igrejas
tudo que você vai encontrar nos púlpitos são mensagens sobre o que os homens
podem fazer para serem alguma coisa melhor do que já são. Até a mistura com
conteúdos de coaching, marketing pessoal e psicologia você encontrará. Aliás,
tem sido comum pastores e líderes entrarem nesses cursos e palestras para serem
mais persuasivos, contagiantes e teatrais (pra não usar manipuladores). O
Espírito Santo não tem muito espaço na TC, mesmo que usem seu nome.
São por esses motivos principais que digo que a TC
está substituindo a TP. Esse discurso tem atraído jovens, empresários,
profissionais liberais, e todo o tipo de gente, principalmente na classe média.
E aqui está a transição entre as duas abordagens. A TP faz uma barganha com
Deus crendo que Ele efetuará milagres para benefício material e espiritual do
homem. A TC eliminou a barganha ao deixar Deus de longe, mas passou a ter no
próprio homem a força “milagrosa” para seu benefício material e espiritual. Na
TP ainda há uma certa dependência de Deus e seu agir sobrenatural, enquanto na
TC o homem declarou sua independência. O relacionamento de barganha foi
substituído para o relacionamento de platéia. O Deus da TC está assistindo e
torcendo pelos grandes empreendedores no palco da fé. Talvez você ache ruim o
uso do palavra coaching, mas pelo que você entenda a expressão completa
“teologia do coaching” que estou usando para definir esse tipo de abordagem.
Essa é uma teologia mais sutil, que parece mais
humilde, mas na verdade transborda soberba ainda mais do que a tenebrosa TP.
Seu ambiente menos escandaloso e mais conformado a cultura secular permite que
esse tipo de abordagem lote igrejas e obtenha grande aceitação. Geralmente se
fala o que as pessoas querem ouvir e pecados são tratados como pedra e
obstáculos no caminho que devem ser superados. A pregação fica até mais
dinâmica, com uso de mídias, frases de efeito e motivação mútua. Tudo isso
associado com o desejo material dos nossos dias só contribuem para que a TC
ganhe terreno. Logo logo nós teremos grandes problemas com ela e talvez ela
chegue ao mesmo patamar da TP. Que Deus nos livre e proteja disso!
O que
Jeremias e Tiago Diriam?
Não quero tornar esse texto num texto longo demais.
Portanto, encerrarei apenas com três passagens bíblicas (quem sabe um artigo
completo poderá sair em breve sobre o tema). Compare com as ideias da TC e veja
como a Bíblia é contrária a isso. Jeremias profetizou para um povo orgulho e
que confiava em suas próprias forças e em sua “tradição espiritual”. Contra
isso Deus falou por meio do profeta:
“Assim diz o
Senhor: “Não se glorie o sábio em sua sabedoria nem o forte em sua força nem o
rico em sua riqueza, mas quem se gloriar, glorie-se nisto: em compreender-me e
conhecer-me, pois eu sou o Senhor, e ajo com lealdade, com justiça e com
retidão sobre a terra, pois é dessas coisas que me agrado”, declara o Senhor”
(Jeremias 9:23,24)
Num momento mais a frente ele resume bem sua
mensagem ao povo:
“Assim diz o
Senhor: Maldito é o homem que confia nos homens, que faz da humanidade mortal a
sua força, mas cujo coração se afasta do Senhor… Mas bendito é o homem cuja
confiança está no Senhor, cuja confiança nele está” (Jeremias 17:5-7)
Encerro com a passagem de Tiago, um verdadeiro
balde de água fria na teologia do coaching:
“Ouçam agora,
vocês que dizem: “Hoje ou amanhã iremos para esta ou aquela cidade, passaremos
um ano ali, faremos negócios e ganharemos dinheiro”. Vocês nem sabem o que lhes
acontecerá amanhã! Que é a sua vida? Vocês são como a neblina que aparece por
um pouco de tempo e depois se dissipa. Ao invés disso, deveriam dizer: “Se o
Senhor quiser, viveremos e faremos isto ou aquilo”. Agora, porém, vocês se
vangloriam das suas pretensões. Toda vanglória como essa é maligna.” (Tiago
4:13-16)
TP e TC, ambas são maléficas e distantes do
cristianismo bíblico que leva o homem a negar a si mesmo, humilhar-se diante de
Deus e depender dele em tudo. Ter sucesso profissional e conquistar riquezas
não é pecado em si, mas isso não pode ser um dos pontos centrais de nossa
espiritualidade cristã. Cuidado para não substituir a teologia da prosperidade
pela teologia do coaching, em ambas o deus que adoram é o mesmo: o homem.
***
¹ Retirado de
http://www.ibccoaching.com.br/portal/coaching/o-que-e-coaching/ Acesso em
28/12/2016
²Ibid
³ Ícaro de Carvalho. Por que o empreendedorismo de
palco irá destruir você. Acesso em 28/12/2016