Por Thiago Oliveira
Desde o Iluminismo, nossa
sociedade foi bombardeada pela negação do sobrenatural. Aquilo que os nossos
sentidos alcançam é o que existe - assim falam os naturalistas. Por Natureza, entende-se
o mundo físico que conhecemos e interagimos. Segundo a ciência, esta mesma
Natureza originou-se de maneira autônoma, impessoal. Foi a partir do movimento
aleatório da matéria que tudo se desenvolveu.
Incluindo a mente humana, que é pessoal. Agora como o impessoal - através
de um processo não ordenado - cria a ordem (leis naturais) e a pessoalidade, isso
a ciência não explica. E nem poderia.
De acordo com a revelação que nos
foi dada, isto é, a Escritura Sagrada, o cosmos tem a sua origem no sobrenatural.
A natureza não “pariu” a si mesma, mas um Ente não-criado, portanto não
pertencente a Natureza (sobrenatural), criou todas as coisas ex-nihilo. Sabemos, pela Escritura, que
o Deus Triúno é este ser não-criado. Assim começa o livro da revelação: “No princípio criou Deus os céus e a terra”.
É assim que a Natureza nasce, através do fiat
divino que com o poder da sua palavra vai chamando a existência aquilo que
inexistia.
Em seu evangelho, o apóstolo João
ao explanar o Logos, isto é, a
natureza lógica, distintiva e pré-existente de Jesus Cristo, afirma que todas
as coisas foram feitas por ele, e sem ele, nada poderia ter sido formado (Jo
1.3). Esta passagem é de suma importância para entendermos que a criação não
foi uma reorganização da matéria que já se fazia presente. A Eternidade é um
atributo exclusivo das pessoas da Trindade. Fora a Trindade, tudo possui um
começo e este começo é resultado do poder sobrenatural do Logos eterno. Em outras palavras: podemos dizer que a criação, tudo
que abarca o Natural, é o primeiro milagre realizado por Deus.
Diante de tudo que foi dito
acima, não há nenhum estranhamento quando lemos na Bíblia a intervenção divina
no cosmos. Chamamos estas intervenções de milagres. Em ambos os testamentos, os
milagres ocorrem e são registrados para que tenhamos a noção da grandeza e
majestade do Criador, que não é o Deus do agnosticismo, que criou o Universo,
mas não se interessa por ele. Não mesmo! O Deus bíblico além de Criador é
Senhor. Ele estabelece a sua soberania se relacionando com a Natureza,
revelando-se nela e intervindo como bem lhe apraz.
Os céticos dirão que as leis da
Natureza são rígidas demais para serem quebradas. Pois bem, um cristão não
negará que existam tais leis. Ninguém em sã consciência vai se atirar de um
prédio de vinte andares para negar que a lei da gravidade está presente no
cosmos. Porém, a existência das leis naturais que regulam o mundo criado não
anula a possibilidade delas serem eventualmente desconsideradas quando o
Criador deseja intervir no espaço e no tempo. Coisas estranhas acontecem com
certa frequência e ferem o que parece ser o lógico para a Ciência. A essas
coisas estranhas dar-se o nome de fenômenos não explicados. Nós, cristãos,
preferimos o termo milagre ou intervenção divina. Ademais, se Deus criou as
coisas visíveis e invisíveis (o mundo Natural e o Sobrenatural) como diz
Colossenses 1.16, logo um milagre não seria necessariamente violar à
criação, mas sim uma interação entre as duas realidades existentes e
pertencentes a mesma criação. Ambos os mundos, o visível e o não visível foram
criados e são regidos pela Deidade. Esse argumento respalda a vivência dos
milagres no intercurso da História.[1]
Em toda Escritura temos o
registro destes dois mundos, ou para ser mais coerente, duas realidades do
mundo criado. Diante de uma gama de passagens bíblicas que atestam esta dupla
realidade coexistente, talvez a que melhor nos sirva seja a que está presente
em 2 Reis 16. 15-17. Ali diz que Jerusalém estava cercada pelas tropas da Síria.
Era um grande contingente de soldados, cavalos e carros de guerra. O servo do profeta
Eliseu, cheio de temor, foi consolado pelo profeta que lhe disse que o exército
que estava ao lado deles era maior. Mas, olhando em volta, não havia nenhum
exército em torno de Eliseu. O profeta então orou pedindo para que Deus abrisse
os olhos de seu servo, e ali ele pôde enxergar que havia uma multidão de cavalos
e carros de fogo ao derredor. O mundo espiritual e o mundo material estão mais
próximos do que imaginamos. O fato de não enxergarmos não quer dizer que não
esteja presente.
No entanto, a Teologia Liberal,
sintetizando a narrativa bíblica com os pressupostos naturalistas, tende a
negar todo o relato metafísico dos Evangelhos. Partem em busca de um Jesus
histórico, homem comum que não nasceu pela concepção do Espírito e nem
ressuscitou dentre os mortos, de fato. Para os teólogos liberais, Jesus está
vivo porque as suas palavras foram disseminadas. Assim, preservamos a vida de
Cristo na medida em que pregamos o que ele ensinou. De igual modo, eles anulam
o caráter expiatório da morte na cruz e a colocam apenas como sendo um ato
exemplar, pois Cristo foi o ser humano (negando sua divindade) que melhor
transmitiu a conscientização do Divino.
A incoerência da Teologia Liberal
é que negar os milagres de Jesus, dentre eles a sua ressurreição é desacreditar
no próprio Cristo que afirmou tais eventos, ou então, o descrédito recai nos
evangelistas que registraram tanto as palavras, como as ações sobrenaturais
realizadas por Jesus. Na busca pelo Cristo histórico não se pode desprezar que
todas as fontes lhe atribuem muitos milagres. Os evangelhos canônicos e
apócrifos são a maior fonte documental acerca de Jesus de Nazaré, e eles
contundentemente afirmam que o seu ministério estava acompanhado de atos miraculosos,
apelando muitas vezes para a quantidade de pessoas que presenciaram os
milagres.
Embora o mundo pós-moderno queira
tragar a esfera sobrenatural, trazendo tudo para o campo da Natureza, existe
uma lacuna enorme em responder diversas questões que os homens fazem com muita
frequência. Se tudo ficar no âmbito do natural, a própria personalidade humana
não faz sentido, uma vez que a Natureza é impessoal. Numa tentativa de burlar
essa lacuna, diversos pensadores naturalistas se referem à Natureza como se
esta fosse uma entidade, mas aí eles caem em contradição, pois ora a Natureza é
um processo aleatório, ora ela é organizada. Fora isso, existe a questão da
moralidade, posta em xeque se o processo evolutivo aleatório for aceito. Por
exemplo: Se a Natureza - através da evolução - deseja a sobrevivência dos mais
fortes e a eliminação dos mais fracos, então sociedades com tecnologia superior
podem exterminar sociedades mais arcaicas? Todas as atrocidades cometidas na
História como as que dizimaram os ameríndios, extinguindo determinadas etnias,
podem ser vistas apenas como algo inerente ao processo evolutivo natural?
À guisa de conclusão, é preciso
reafirmar o nosso posicionamento sobrenaturalista, mesmo que sejamos os
estranhos no ninho. Não devemos assumir esta posição somente através do discurso teórico.
É preciso viver o Cristianismo com a perspectiva de que existe a vida no âmbito
espiritual e que não deixaremos de existir quando a morte vier nos tragar. A
morte é apenas a porta de transição entre as duas realidades. Passamos do natural para o sobrenatural quando morremos, dando continuidade a nossa
pessoalidade. Seguir a Cristo é desprezar o naturalismo e crer naquilo que está
além dos nossos sentidos, Se abraçarmos a Teologia Liberal, não mística, apenas
moralista, então nos enquadramos nas seguintes palavras do apóstolo Paulo:
“Se esperamos em Cristo só nesta
vida, somos os mais miseráveis de todos os homens”.
I Corintios 15:19
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[1] O milagre tem uma causa: Deus. Mas sua intervenção sobrenatural vai se moldando as leis naturais e segue o seu curso. Exemplo: A concepção virginal de Maria fez com que ela engravidasse como qualquer mulher. A gestação seguiu as etapas normais até chegar o momento dela dar a luz, também de uma maneira natural, como qualquer gestante que concebeu após o ato sexual.