Por Thiago Oliveira
Mateus
7:
1 "Não julguem, para que vocês não
sejam julgados.
2 Pois da mesma forma que julgarem, vocês
serão julgados; e a medida que usarem, também será usada para medir vocês.
3 "Por que você repara no cisco que
está no olho do seu irmão e não se dá conta da viga que está em seu próprio
olho?
4 Como você pode dizer ao seu irmão:
'Deixe-me tirar o cisco do seu olho', quando há uma viga no seu?
5 Hipócrita, tire primeiro a viga do seu
olho, e então você verá claramente para tirar o cisco do olho do seu irmão.
Introdução
O texto que nos serve de
base é o início da parte final do Sermão do Monte. Devemos lembrar que é um
sermão endereçado aos fiéis, pois, Jesus começa com as bem-aventuranças, algo
que descreve o caráter dos que são remidos. Seu ensinamento é prático, coerente
com a Lei de Deus e está em ferrenha oposição ao ensino dos fariseus. Este
grupo religioso deturpou e muito a Palavra, tornando-a conveniente a elevação
do status quo dos mesmos, que se
consideravam justos devido aos seus próprios méritos. Acontece que eles haviam
rebaixado o padrão de Deus. Deixe-me exemplificar: A não ser que você seja
alguém com estatura, impulsão e aptidão para o basquetebol, provavelmente você
não conseguirá fazer uma enterrada. Mas digamos que você rebaixe a tabela, cerca
de um metro. Conseguirá agora? Presumimos que sim, todavia, você e eu sabemos
que não é uma enterrada legítima, ao estilo da NBA. Era exatamente assim que os
fariseus faziam. Jesus os chama de hipócritas, e não é à toa.
Em todo o sermão, o
antagonismo fica evidente quando Cristo diz, “ouvistes o que foi dito, eu porém vos digo”. Ele está ali colocando
o seu ensino em confronto com o ensino farisaico. Eram eles os mestres daquele
povo. Ao ficar ciente desse contexto, a compreensão daquilo que Jesus nos diz
nestes primeiros versículos de Mateus 7 torna-se mais clara. Que esse estudo
venha a atingir diretamente o nosso ego, nos fazendo atentar para o que precisa
mudar, para sermos cristãos diferente do que estamos sendo.
O
porquê de não julgar
Cristo começa dando uma
sentença. E qual é ela? “Não julguem”.
No entanto, esse versículo tirado do seu contexto gera uma confusão que permeia
a mente de muitos. Será que aqui Jesus nos diz que não devemos analisar nada e
nem ninguém? Será que não podemos dizer que alguém que está em pecado é pecador?
Será que se um homem prega algo antibíblico, não devemos julgá-lo como herege? Lógico
que não é isso que o Senhor nos pede. De modo algum Jesus nos proíbe de
discernir, avaliar e ponderar. Se fosse assim, como teria dito logo em seguida:
“Não deis aos cães as coisas santas, nem
deiteis aos porcos as vossas pérolas, não aconteça que as pisem com os pés e,
voltando-se, vos despedacem” (v.6)? Ora, para identificar quem são os cães
e quem são os porcos, é necessário julgar. O julgamento é uma responsabilidade
de todo crente, todavia, não deve ser feito de acordo com o mero achismo ou sem
conhecimento de causa. O ato de julgar é respaldado pela Palavra. A própria
Escritura é o parâmetro e não a nossa justiça própria (João 7:24). E se há
condenação, quem condena é o próprio SENHOR, através da sua Lei registrada na
Bíblia.
Para que não haja sombra de
dúvidas, observem o que é dito nos versículos 15 ao 20: "Cuidado com os falsos profetas. Eles vêm a
vocês vestidos de peles de ovelhas, mas por dentro são lobos devoradores. Vocês
os reconhecerão por seus frutos. Pode alguém colher uvas de um espinheiro ou
figos de ervas daninhas? Semelhantemente, toda árvore boa dá frutos bons, mas a
árvore ruim dá frutos ruins. A árvore boa não pode dar frutos ruins, nem a árvore
ruim pode dar frutos bons. Toda árvore que não produz bons frutos é cortada e
lançada ao fogo. Assim, pelos seus frutos vocês os reconhecerão!” É preciso
exercer juízo de valor, atentando para os frutos, isto é, pensamentos e ações,
para se discernir quem é um falso profeta e consequentemente não ouvi-lo e nem
segui-lo.
Mas então, o que Jesus está
dizendo? Lembre-se que seu ensino está em oposição ao grupo dos fariseus. Estes
viviam emitindo sentenças baseadas em sua própria justiça. Em Lucas 16:15 o
Senhor lhes repreende dizendo: "Vocês
são os que se justificam a si mesmos aos olhos dos homens, mas Deus conhece os
corações de vocês”. Todo fariseu adorava transparecer uma impressão de
piedade e obediência a Lei. Eles aparentavam um semblante triste para dizer que
jejuavam, mandavam tocar trombeta todas as vezes que iam ofertar, oravam em voz
alta nas esquinas, dando uma ideia de que não aguentavam chegar na sinagoga
para orar, de tão fervorosos que eram, etc. A parábola do Fariseu e do
Publicano mostra o tipo de imagem que os fariseus faziam de si próprios.
A parábola em questão está
no capítulo 18 do Evangelho de Lucas. O propósito de Jesus ter contado nos é
dito no versículo 9: “A alguns que
confiavam em sua própria justiça e desprezavam os outros, Jesus contou esta
parábola”. Pelo personagem escolhido por Jesus, não nos resta dúvida, os
fariseus eram quem se vangloriavam. A oração farisaica, segundo a parábola, era
assim: “Deus, eu te agradeço porque não
sou como os outros homens: ladrões, corruptos, adúlteros; nem mesmo como este
publicano” (Lucas 18:11).
Esse é o tipo de julgamento
que não devemos proferir: Que condena, discrimina e menospreza, fundamentado em
nossa índole, como se fôssemos melhores por fazermos determinadas coisas. Não
somos bons por nós mesmos. Tudo o que somos de bom procede do nosso Pai. Podemos
até nos reportar a alguém que esteja vivendo em pecado, mas não devemos nos
apresentar como superiores, desajudando quem peca. Toda correção deve ser feita
com amor, visando que a pessoa corrigida abandone o pecado que lhe prende.
Disciplinar é um ato amável e não um ato de desprezo. Esse juízo temerário não
nos cabe. É nesse sentido que o Mestre nos adverte para que não julguemos.
Recebendo
na mesma medida
Cristo usa de tremenda
sabedoria quando diz: “Pois da mesma
forma que julgarem, vocês serão julgados; e a medida que usarem, também será
usada para medir vocês”. Isso é verdadeiro e me faz lembrar da anedota de
certa senhora que observava sempre os lençóis que a sua vizinha estendia no
varal. Ela bisbilhotava pela janela de vidro e compartilhava com o seu marido o
quanto que a vizinha era desleixada e suja com os afazeres domésticos, pois os lençóis
eram manchados e tinham um aspecto encardido. Tal análise se repetia
constantemente. Num belo dia ela admirou-se e relatou ao marido que finalmente a
vizinha havia feito um bom serviço. Os lençóis, segundo ela, estavam branquinhos.
No entanto, o marido lhe fez uma revelação que a constrangeu. Naquela manhã,
ele havia limpado a vidraça.
A ilustração acima é bem oportuna.
Não era a vizinha que era suja e desleixada, conforme presumia a bisbilhoteira.
Pelo contrário, era ela a emporcalhada. A medida que ela usava para emitir seu
julgamento, lhe caiu como uma luva e a deixou, com perdão do trocadilho, em
maus lençóis. No entanto, a questão vai um pouco mais além. O problema de
julgarmos conforme nossas medidas é que o SENHOR nos julgará com as mesmas. O
apóstolo Paulo nos dá uma excelente ajuda para que entendamos melhor. Vejamos o
que ele nos diz em Romanos 2: 1-6:
"Portanto, você, que julga, os outros é indesculpável; pois está
condenando a si mesmo naquilo em que julga, visto que você, que julga, pratica
as mesmas coisas. Sabemos que o juízo de Deus contra os que praticam tais
coisas é conforme a verdade. Assim, quando você, um simples homem, os julga,
mas pratica as mesmas coisas, pensa que escapará do juízo de Deus? Ou será que
você despreza as riquezas da sua bondade, tolerância e paciência, não
reconhecendo que a bondade de Deus o leva ao arrependimento? Contudo, por causa
da sua teimosia e do seu coração obstinado, você está acumulando ira contra si
mesmo, para o dia da ira de Deus, quando se revelará o seu justo julgamento. Deus
, retribuirá a cada um conforme o seu procedimento’".
Embora Paulo nos fale sobre
um julgamento diferente, que levará os ímpios a danação, enquanto que Jesus
fala de um julgamento galardoador, pois seu público alvo são os cristãos e
estes não perdem a salvação, mas perderão alguma coisa na dimensão da Glória, o
princípio é o mesmo. Deus julgará cada um segundo suas obras, crentes e
incrédulos (ver 2 Coríntios 5:10). E se não quisermos ser envergonhados na presença
de Deus, então não devemos ser irresponsáveis ao que se refere ao julgamento
alheio.
Já
olhou para a sua condição?
O grand finale dessa seção sobre o julgamento (versículos 3-5) é
regado a muita ironia. Cristo quer que imaginemos numa cena, alguém com um
bastão enfiado no olho, que está preocupado com um cisco no olho de outrem.
Algo muito tosco. E é exatamente isso que Jesus quer repassar com sua linguagem
hiperbólica. Aqui ele trata do hipercriticismo que usamos com os demais, sem
utilizar-se de tanta minúcia para fazermos um autoexame. Para reparar um cismo
no olho de alguém, preciso estar muito atento, meio que procurando algo para
tomar nota. Isso é o que muita gente anda fazendo nas igrejas. O patético disso
é que enquanto nos alarmamos com o pequeno fiapo que está no globo ocular do
nosso irmão, nós estamos com a visão prejudicadíssima e nem sequer removemos
aquilo que afeta nossa vista.
Recentemente li uma frase do
pastor presbiteriano, Ricardo Barbosa que gostaria de compartilhar aqui. Ele
diz: "Muitas vezes queremos uma
igreja diferente que nos faça diferentes, mas não queremos ser pessoas
diferentes que constroem uma comunidade diferente". Assim são os que
ostentam suas traves, mas que reparam a farpa alheia. Isso demonstra que a
intenção não é boa. Tais pessoas não estão preocupadas com a condição de seus
irmãos, pois, se estivessem, olhariam primeiro para si mesmas. Se um cego não
pode nem guiar outro cego, quanto mais curá-lo? A Escritura nos diz: “Examinem-se para ver se vocês estão na fé;
provem-se a si mesmos” (2 Coríntios 13:5). O Evangelho não é joguinho de
tiro ao alvo. O objetivo primário não é encontrar o erro do irmão, mas ver o
meu erro e correr para Cristo, clamando pela sua ajuda. Já dizia Lutero logo na
sua primeira das 95 teses que assinalou: “Dizendo
nosso Senhor e Mestre Jesus Cristo: Arrependei-vos...., certamente quer que
toda a vida dos seus crentes na terra seja contínuo arrependimento.”
A palavra que Jesus usa para
descrever a pessoa que aponta para os erros dos outros sem corrigir os seus é:
Hipócrita. Ou seja: fingido, embusteiro. Um termo forte que nos deve levar a
confrontar nosso ego e nosso narcisismo. Assuma sua condição pecaminosa. Assuma
seus pecados, lute contra eles, mas não lute sozinho, recorra ao único que pode
removê-los pelo poder do seu Espírito. Você deve fazer isso e eu também. Não
sou nem melhor e nem pior que qualquer outro ser humano da face da terra. Sou tão
necessitado de Graça quanto qualquer um é. Por isso, ao orar, oremos como o publicano:
“Deus, tem misericórdia de mim, que sou
pecador” (Lucas 18:13).
Considerações
Finais
1. Devemos evitar a postura
dos fariseus, que se achavam bons o suficiente para recriminar os seus
patrícios. Olhemos para os mais novos e débeis na fé e lembremos que já passamos
pela mesma fase, se ainda não estivermos nela. Podemos até ajudá-los, não sem
antes provar a nós mesmos e termos a certeza que somos aptos para prestar o auxílio,
pois superamos aquilo que perturba o nosso irmão que está mais vulnerável.
2. Cuidado com o senso
crítico. Ele faz bem e nos evita de cairmos em muita roubada. Todavia, quando
ele é demasiado, corremos o risco de errarmos em quase todas as conclusões que
tomamos a respeito de vários assuntos. Se tudo que você enxerga na Igreja, no pastor,
nos líderes e demais irmãos for ruim, provavelmente o problema está consigo e
não com os demais. Lembre-se que nunca haverá igreja perfeita, sendo você um
membro desta igreja. Por acaso você e eu somos perfeitos?
3. Examinemos a nós mesmos frequentemente.
Uma sugestão: Peguemos os 10 mandamentos e no final do dia vejamos se
descumprimos algum. Devemos anotar os mandamentos quebrados e soma-los no final
da semana. Se achamos que somos os santarrões, iremos levar um cruzado direto
no queixo ao consultarmos o resultado. Ai de nós se não fossem as misericórdias
do SENHOR renovadas a cada manhã. O arrependimento tem que ser constante.
Que Deus nos ajude. A Ele a
glória!