Por Alan Rennê Alexandrino
É bem verdade que a
necessidade da pregação expositiva é evidente, em virtude de que somos gerados
pela palavra da verdade (Tiago 1.18), somos santificados pela verdade da
Palavra de Deus (João 17.17), e somos alimentados com as palavras da fé e da
boa doutrina que temos seguido (1Timóteo 4.6). Não obstante, creio que quando
observamos o que as Escrituras nos mostram acerca do modo como Deus alimenta e
edifica a sua Igreja e leva adiante a expansão do reino, outras razões que
evidenciam a necessidade da exposição bíblica em nossos púlpitos se tornam
também mais claras.
Na sua clássica obra
Pregação e Pregadores, o Dr. David Martyn Lloyd-Jones faz a seguinte assertiva:
“... eu diria, sem hesitação, que a mais urgente necessidade da igreja cristã,
na atualidade, é a pregação autêntica. E, visto que esta é a maior e mais
urgente necessidade da igreja, evidentemente ela é também a maior necessidade
do mundo” [1]. De acordo com ele, esta necessidade tem sido contestada nos
últimos tempos. Apesar disso, ela precisa ser afirmada e defendida, pois nada é
mais importante do que o ensino dos crentes [2]. Sidney Greidanus pontua que,
“se os pregadores contemporâneos, semelhantemente, desejam falar com
autoridade divina, devem falar não sua própria palavra, mas a daquele que os
enviou” [3]. Assim sendo, penso que a pregação expositiva das Sagradas Escrituras
se faz necessária devido às seguintes razões [4].
Primeiro, pregação é a maneira revelada de
Deus fazer a si mesmo e seu pacto salvífico conhecidos a nós. A Bíblia
apresenta Deus, o Criador, como alguém que se comunica, e o tema e a substância
da sua comunicação, desde o Éden, como um relacionamento gracioso e vivificante
com pecadores remidos. Toda informação factual e todo direcionamento ético que
Deus comunica através da sua Palavra escrita alimenta esse relacionamento,
primeiro por estabelecê-lo através do arrependimento e fé em Jesus Cristo, e
depois por aprofundá-lo através do crescente conhecimento de Deus e da maneira
como servi-lo. Esta é a vida pactual do povo de Deus. A Bíblia estabelece que a
maneira como Deus mantém a sua comunicação conosco é através da agência de
homens enviados a nós como seus mensageiros. Como porta-vozes de Deus e de sua
mensagem, os pregadores se tornam emblemas, modelos e incorporações do discurso
pessoal de Deus para cada um dos seus ouvintes, e por seu próprio compromisso
com a mensagem que trazem, eles também se tornam modelos da resposta pessoal à
mensagem de Deus. Tais eram os apóstolos e profetas. Tal era o Senhor Jesus
Cristo. E tais devem ser os pregadores dos nossos dias.
J. I. Packer chama isso de “comunicação
encarnacional” [5]. De acordo com ele, somente a pregação bíblica expositiva
capacita o pregador a referendar o que ele proclama, por ser transparentemente
comprometido com a mensagem da Escritura de uma forma sincera e profunda.
Somente a pregação expositiva possibilita que o pregador permaneça sob a
autoridade da Palavra e da sua mensagem e faz com que ele conheça
verdadeiramente o poder daquilo que ele proclama.
Segundo, a pregação expositiva comunica a
força da Bíblia como nenhum outro meio é capaz de fazer. Do que foi dito
anteriormente apreende-se que, a Sagrada Escritura, em e de si mesma, é
pregação. De certo ponto de vista, a Bíblia é os servos de Deus, apóstolos e
profetas, pregando. De outro ainda mais profundo, a Bíblia é o próprio Deus
pregando. Alguns dos seus sessenta e seis livros, como os oráculos proféticos
do Antigo Testamento e as cartas neotestamentárias, são, explicitamente,
sermões. Além disso, os sessenta e seis foram escritos visando a edificação e o
ensino das pessoas que conhecem o Deus vivo, e o amam, cultuam e o servem.
Packer afirma: “O texto da Bíblia é o verdadeiro pregador, e o papel do homem
no púlpito ou do conselheiro é simplesmente deixar que as passagens digam sua
porção através dele” [6].
Pregar a Bíblia é afirmar e explorar a relação
existente entre a Palavra de Deus (escrita e transmitida como Escritura pela
agência do Espírito Santo, e agora aplicada aos nossos corações pela agência do
mesmo Espírito) e vidas humanas. Pregar é explorar a relação das Sagradas
Escrituras com a vida das ovelhas de Deus. A atividade de pregar a Bíblia faz
com que ela seja aberta para a mente e o coração, e a atividade de ouvir a
Escritura pregada, recebendo o que é dito, meditando sobre o texto e como a
pregação o elucidou, e deixando-a aplicar-se aos nossos próprios pensamentos
nos leva, verdadeiramente, para dentro da Bíblia, permitindo-nos compreender e
apreender o que Deus está nos dizendo através do texto.
Terceiro, pregar
expositivamente realça a identidade da igreja e esclarece o seu chamado como
nenhuma outra atividade é capaz de fazer. Temos testemunhado em nossa sociedade
uma crise de identidade quanto ao que significa ser igreja. Existe um senso de
identidade extremamente fraco em muitas igrejas. A igreja é vista por muitos
apenas como uma espécie de clube social ou como uma espécie de grupo de
interesses comuns. Por essa razão, há urgência em se pregar a Escritura, seu
evangelho, seu Cristo, e sua ética, de maneira que a debilitada consciência da
igreja acerca da sua identidade e vocação. Pregar a Escritura é a única
atividade que pode conseguir isso. É a única atividade capaz de manter diante
do povo o senso de sua identidade como povo de Deus e povo do Livro, e de sua
vocação, a saber, a de testemunhas de Cristo Jesus.
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[1] D. Martyn Lloyd-Jones.
Pregação e Pregadores. São José dos Campos: Fiel, 2008. p. 15.
[2] Ibid. p. 35.
[3] Sidney Greidanus. O
Pregador Contemporâneo e o Texto Antigo. p. 27.
[4] Adaptadas a partir de:
J. I. Packer. “Why Preach?” In:
Samuel T. Logan Jr. The Preacher and Preaching: reviving the art. Phillipsburg,
NJ: P&R Publishing, 2011. pp. 3-24.
[5] Ibid. p. 16.
[6] Ibid. p. 37.