Por Alan Rennê Alexandrino
Meu último ponto
aborda a necessidade de congruência entre exegese e teologia sistemática na
atividade da pregação expositiva. Seria bom termos uma palestra apenas sobre
este assunto. Como isso não é possível no momento, limitar-me-ei ao
desenvolvimento de uma problemática e ao apontamento de algumas sugestões, a
fim de expor a necessidade de que nossas pregações sejam teológicas.
É comum
encontrarmos o pensamento de que ser um teólogo sistemático e um bom expositor
são duas coisas extremamente difíceis de unir. É comum ouvirmos que alguns, por
conta do seu perfil de mestre, serviriam melhor em uma sala de aula, enquanto
outros, por causa da sua paixão, seriam mais bem utilizados no púlpito e no
pastorado. Tom Ascol, um teólogo batista, afirma que uma frase comum nas
congregações é: “Nosso pastor não é um teólogo, ele é um pregador”. Contudo, discordando dessa
dicotomia, ele afirma acertadamente que, “ignorância doutrinária no banco da
igreja é o resultado da apatia teológica no púlpito”. Ernest Reisinger afirma
que, “às vezes, a pregação doutrinária é estigmatizada como maçante, morta e
inútil. É mencionada como uma oferta de ossos secos a almas que desejam o leite
puro e a carne da Palavra”. Ele diz ainda que muito da
objeção à pregação doutrinária e teológica se dá por conta de doutrinas que os
objetores não gostam. Ascol alerta para o fato
de que, “a divisão do ‘pastor-teólogo’ em duas funções separadas e não
relacionadas não ocorreu sem terríveis consequências para a igreja. Por um
lado, a pregação tem se tornado cada vez mais vazia de conteúdo doutrinário”.
O fato, é que
teologia é algo essencial à pregação. Novamente citando Tom Ascol: “A convicção
de que a compreensão teológica é integral ao ministério pastoral –
especialmente a pregação – era comum entre nossos antepassados protestantes.
Para eles era axiomático que sem a primeira ninguém se atreveria a desempenhar
a última”. Sem teologia não existe
pregação, ao menos não no sentido neotestamentário. Pregação expositiva é a
apresentação de uma mensagem sobre os grandes temas teológicos da Escritura.
Com base nisso, Donald Macleod afirma que, “a mensagem correta pobremente
proclamada é preferível a uma falsa mensagem bem proclamada”. Nesse sentido, o apóstolo
Paulo pode ser apontado como o exemplo de alguém que alcançou uma perfeita
congruência entre o kerygma, a proclamação e os temas teológicos:
Paulo via sua própria função como sendo declarar a palavra da cruz. Ele
teve de proclamar os fatos: Cristo morreu, Cristo ressuscitou. Mas ele também
teve de proclamar o significado desses fatos. Sem interpretação, eles eram
inúteis e sem significado. Interpretados como sofrimento vicário de Cristo pelo
pecado e como prova de sua divina filiação e senhorio, eles eram o poder
salvífico de Deus.
Isto posto, os
grandes temas teológicos, cristológicos e soteriológicos devem anunciados
claramente em nossa pregação. O Rev. Paulo Anglada corrobora esse entendimento:
“Porque a Bíblia reivindica ser Palavra inspirada de Deus e acerca de Deus, a
pregação bíblica é necessariamente teológica”. Ele continua afirmando:
Cada texto deve ser pregado levando-se em consideração o seu lugar no
conjunto de verdades reveladas no cânon bíblico. O caráter de Deus e o seu
plano eterno integral, incluindo as obras da criação, da providência e da
redenção; a natureza decaída do homem; a pessoa e obra do “Cristo dos pactos”
em seus ofícios real, profético e sacerdotal; a pessoa e obra toda do Espírito
Santo, não apenas como distribuidor de dons espirituais; mas com relação à
unção de Cristo, a revelação, a inspiração e iluminação, a regeneração, a
santificação, a vivificação, a pregação, etc.; a doutrina bíblica sobre a
igreja; sobre as últimas coisas, etc., são, ao mesmo tempo, temas e pano de
fundo teológico da pregação reformada.
Na prática, o
que foi apontado aqui é nada mais nada menos do que a aplicação correta da analogia fidei, isto é, a analogia da
fé, exposta na Confissão de Fé de
Westminster:
A regra infalível de interpretação da Escritura é a mesma Escritura;
portanto, quando houver questão sobre o verdadeiro e pleno sentido de qualquer
texto da Escritura (sentido que não é múltiplo, mas único), esse texto pode ser
estudado e compreendido por outros textos que falem mais claramente.
Por exemplo, expor
a passagem de Atos 16.31: “Crê no Senhor
Jesus e serás salvo, tu e tua casa”, requer que recorramos à doutrina
completa acerca da fé salvífica. De igual modo, expor 1João 3.2: “Amados, agora, somos filhos de Deus”
exige uma exposição da doutrina da adoção. Isaías 6.3: “Santo, Santo, Santo, é o SENHOR dos Exércitos” torna imprescindível
a exposição acerca do atributo divino da santidade. Em todos os casos, a
exposição procede por trazer a uma única passagem tudo o que a Escritura tem a
dizer a respeito de um tema teológico.
Outro princípio
ao qual devemos atentar, é: “o sistema de doutrina exerce controle sobre a
exposição de uma passagem particular”. A questão é que,
precisamente porque existe um sistema, e porque a verdade é uma, a dogmática
estabelece parâmetros que nossa exegese nunca deverá ultrapassar. Alguém
poderia perguntar: “Mas isso não seria algo semelhante a impor sobre o texto
nossas pressuposições?” O problema é que, além de não existir na terra um
pensador livre de pressuposições, imagine aplicar esta reivindicação romântica
ao Salmo 6.5: “Pois, na morte, não há
recordação de ti; no sepulcro, quem te dará louvor?” Nenhuma exposição
dessa passagem deve contradizer a doutrina da imortalidade da alma ou sequer
sugerir que o estado intermediário entre a morte e a ressurreição é qualquer
outra coisa que não um estado de consciência.
Outro princípio
seria o uso dos credos, confissões e dos catecismos protestantes e reformados.
Tais documentos podem ser usados como “ajuda para a exegese. Frequentemente
eles proporcionam excelentes esboços de tópicos bíblicos”.
Por fim, com o
objetivo de estimulá-los a serem “pregadores-teólogos”, permitam-me
compartilhar uma fantástica observação feita por Stuart Olyott, na sua obra Pregação Pura e Simples:
Os pregadores mais poderosos são sempre aqueles que são fortes em
teologia dogmática. Aceitam um sistema de doutrina que governa todo o seu
viver. Esse sistema de doutrina determina a crença e controla o comportamento
deles. Expressa-se nas orações e se manifesta claramente na pregação deles. São
homens de convicções.
Que o Senhor nos
abençoe! Amém!