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19 de abr. de 2015

Cristo e Eu (2/3)

Por Charles Spurgeon
Em segundo lugar, nosso texto de forma muito clara, NOS ENSINA O ENTRELAÇAMENTO DE NOSSA PRÓPRIA PERSONALIDADE COM A DE JESUS CRISTO.
Leiam o texto de novo: “Com Cristo estou juntamente crucificado, e já não vivo eu, mas Cristo que vive em mim; e o que agora vivo na carne, vivo na fé do Filho de Deus, aquele que me amou e se entregou por mim”. Aí está o homem, mas aí está o Filho de Deus de maneira conspícua, e as duas personalidades estão singularmente entrelaçadas. Parece que vejo duas árvores à minha frente. São plantas individuais que crescem uma junto à outra, mas ao analisar sua parte inferior, observo que as raízes estão tão entrelaçadas e entrecruzadas que ninguém pode separar as árvores individualmente e atribuir os membros de cada uma a sua própria unidade. Assim são Cristo e o crente. Parece que vejo diante de mim uma videira. Para lá está um ramo, único e perfeito como um galho; não há de ser confundido com nenhum outro; é um galho – um galho inteiro e perfeito – e, sem dúvida, quão perfeitamente unido está ao tronco, e quão completamente fundida à videira da qual é um membro! Agora notem, o mesmo sucede ao crente em Cristo.
Houve um progenitor que lançou sua sombra através de nossa senda, e de cuja influência não podemos escapar nunca. De todos os demais homens poderíamos escapar e declarar estarmos separados, mas este homem em particular era parte de nós mesmos, e nós parte dele: se trata do primeiro Adão, em seu estado caído; estamos caídos nele, e estamos desfeitos em sua ruína. E agora, glória seja a Deus, como a sombra do primeiro homem tem sido suprimida em nós, aparece um segundo homem, o Senhor do céu; e através de nossa senda se derrama a luz de Sua glória e de Sua excelência, da qual também, bendito seja Deus, nós, os que cremos Nele, não podemos escapar; na luz deste homem – o segundo Adão, a cabeça federal celestial de todo Seu povo – em Sua luz nos regozijamos. Entrelaçadas com nossa história e personalidade estão a história e a personalidade do homem Jesus Cristo, e nós somos um com Ele para sempre.
Observem os pontos de contato. Primeiro Paulo diz: “Com Cristo estou juntamente crucificado”; o que pretende dizer? Pretende dizer muitíssimas coisas mais do que poderia mencionar esta manhã; mas, brevemente, pretendo dizer isto: que ele acreditava na representação de Cristo na cruz; mantinha que, quando Jesus Cristo foi cravado na cruz, não pendeu de lá como uma pessoa privada, mas como o representante de Seu povo escolhido. Assim como o representante de um distrito na Câmara dos Comuns não vota só por si mesmo, mas em nome do distrito que o enviou ao Parlamento, assim o Senhor Jesus Cristo, no que fez, atuou como o grande representante público, e a morte de Jesus Cristo na cruz foi a morte virtual de todo o Seu povo. Então, todos os seus santos restituíram à justiça o que era devido e fizeram uma expiação por todos os seus pecados ante a vingança divina. “Com Cristo estou juntamente crucificado”. O apóstolo dos gentios se deleitava pensando que como um membro do povo escolhido de Cristo, ele morreu na cruz em Cristo. Fez algo mais que crer nisso doutrinalmente, pois o aceitou confiadamente, depositando sua esperança nisso. Acreditava que em virtude da morte em Cristo, ele mesmo havia pago à lei o que devia, que havia satisfeito à justiça divina, e que havia encontrado a reconciliação com Deus.
Amados, quão bendito é quando a alma pode, por dizer assim, estender-se sobre a cruz de Cristo e sentir: “estou morto; a lei me matou, maldisse-me, imolou-me e, portanto, sou livre do seu poder porque em minha Fiança levei a maldição, e na pessoa de meu Substituto foi executado contra mim tudo o que a lei podia fazer como condenação, pois estou crucificado com Cristo”.
Oh! Quão bendito é quando a cruz de Cristo é posta sobre nós: como nos ressuscita! Assim como o ancião profeta subiu e se estendeu sobre o menino morto, pondo sua boca sobre a boca dele, e suas mãos sobre as mãos suas, e seus pés sobre os pés do menino, e logo o menino ressuscitou, do mesmo modo quando a cruz é posta sobre minha alma, infunde-me vida, poder, calor e consolo. A união com o Salvador sangrento e sofredor e a fé no mérito do Redentor, são coisas que reanimam a alma. Oh! Que tivéssemos mais gozo dessas coisas!
Paulo quis dizer, ainda, algo mais que isso. Não somente acreditava na morte de Cristo e confiava nela, mas que efetivamente sentia em sua pessoa o seu poder, o qual gerava a crucificação de sua velha natureza corrupta. Se você se concebe como um homem executado, de imediato percebe que sendo executado pela lei, a lei não tem nenhuma reclamação adicional sobre você; você resolve, ademais, que tendo provado uma vez a maldição do pecado pela sentença ditada sobre você, não cairá novamente nessa mesma ofensa, mas a partir de agora, sendo liberado milagrosamente da morte à que a lei lhe levou, viverá em vida nova. Deve sentir isso se sente devidamente. Assim Paulo se via como um criminoso sobre o qual a sentença da lei já havia sido cumprida. Quando via os prazeres do pecado, dizia: “não posso desfrutá-los; estou morto para eles. Uma vez tive uma vida na qual os pecados eram doces para mim, mas essa vida foi crucificada com Cristo; por conseguinte, como um morto não pode ter nenhum deleite nos gozos que uma vez foram deleites para ele, tampouco posso ter eu”. Quando Paulo olhava as coisas carnais do mundo, dizia: “antes eu permitia que essas coisas reinassem sobre mim. ‘Que comerei? Que beberei? E com o que me vestirei?’ Essas coisas constituíam uma trindade de perguntas de suprema importância; agora não têm nenhuma importância, porque estou morto para essas coisas; eu deixo para Deus as preocupações com respeito a elas; não são minha vida; estou crucificado para elas”. Seja qual for a paixão, o motivo, o desígnio que possam vir à nossa mente, que não seja a cruz de Cristo, deveríamos exclamar: “Longe está de mim gloriar-me em alguma dessas coisas; eu sou um homem morto. Vamos, mundo, com toda a sua bruxaria; vamos, prazer, com todos os seus encantos; vamos, riqueza, com todas as suas tentações; vamos, todos vocês, tentadores que têm seduzido a tantos; que podem fazer com um homem crucificado? Como podem tentar a um que está morto para vocês?”. Agora, é um bendito estado mental quando um homem pode sentir que por haver recebido a Cristo ele é como alguém que está completamente morto para este mundo. Nem entrega sua fortaleza aos seus propósitos, nem sua alma aos seus costumes, nem seu juízo às suas máximas, nem seu coração aos seus afetos, pois é um homem crucificado através de Jesus Cristo; o mundo foi crucificado para ele, e ele para o mundo. Isso foi o que quis dizer o apóstolo.
Notem, em continuação, outro ponto de contato. Paulo disse: “Contudo vivo”, mas logo corrige a si mesmo: “e já não vivo eu, mas Cristo que vive em mim”. Vejam vocês o estado morto de um crente: está surdo, mudo, cego e sem sentimento quanto ao mundo pecador, e não obstante, acrescenta: “Contudo vivo”. Explica qual é a sua vida: sua vida é produzida nele em virtude de que Cristo está nele e ele está em Cristo. Jesus é a fonte da vida do cristão. A “alma” da videira vive inclusive nos minúsculos raminhos. Não importa quão diminuto possa ser o nervo, o especialista na anatomia dirá que a vida cerebral palpita na extremidade mais distante. O mesmo acontece em cada cristão; ainda que o cristão possa ser insignificante, e possua pouca graça, contudo, se é verdadeiramente um crente, Jesus vive nele. A vida que mantém em existência sua fé, sua esperança e seu amor, provêm de Jesus Cristo e unicamente Dele. Nós cessaríamos de ser santos viventes se não recebêssemos diariamente uma graça proveniente de nossa Cabeça da Aliança. Como a força da nossa vida vem do Filho de Deus, então Ele é o governador e o poder matriz em nosso interior. Como pode ser cristão alguém que é governado por qualquer coisa que não seja Cristo? Se chama Cristo “Mestre e Senhor”, você tem que ser Seu servo; tampouco podes render obediência a nenhum poder rival, pois ninguém pode servir a dois senhores. Tem que haver um espírito orientador no coração, e a menos que Jesus Cristo seja para nós esse espírito que orienta, não somos salvos de todo. A vida do cristão é uma vida que brota de Cristo, e é controlada por sua vontade.
Amados, sabem algo a respeito disso? Temo que é uma conversa insossa para vocês a menos que a sintam. Tem sido sua vida assim durante a semana passada? Tem sido a vida que vocês viveram de Cristo vivendo em vocês? Tem sido essa vida como um livro impresso com letras claras, no qual os homens poderiam ler uma nova edição da vida de Jesus Cristo? Um cristão deveria ser uma fotografia vivente do Senhor Jesus Cristo, ser uma impactante semelhança do seu Senhor. Quando os homens o olham deveriam ver não só o que é o cristão, mas o que é o Senhor do cristão, pois deveria ser como seu Senhor. Você tem visto alguma vez ou tem sabido que no interior da sua alma Cristo olha por seus olhos para os pobres pecadores e considera como poderia ajudá-los; que Cristo palpita em seu coração, sentindo pelos que perecem, tremendo por aqueles que não querem tremer por eles mesmos? Vocês sentem alguma vez que Cristo abre as suas mãos em generosa caridade para ajudar os que não podem ajudar a si mesmos? Sentiram alguma vez que algo diferente de você mesmo estava em você, um espírito que algumas vezes luta consigo mesmo, e o agarra pela garganta e ameaça destruir seu egoísmo pecaminoso; um espírito nobre que põe seu pé sobre o peito da ganância, um espírito valente que leva ao solo o seu orgulho, um espírito ativo e fervente que queima sua ociosidade? Você nunca sentiu isso? Certamente nós que vivemos para Deus sentimos a vida de Deus em nosso interior e desejamos ser submetidos cada vez mais ao espírito dominante de Cristo, para que nossa humanidade possa ser um palácio para o Bem Amado. Isso é outro ponto de contato.
Prosseguindo, o apóstolo diz, e eu espero que mantenham abertas suas Bíblias para ler o texto: “E o que agora vivo na carne, vivo na fé do Filho de Deus”. A vida do cristão deve ser em cada momento uma vida de fé. Cometemos um erro quando procuramos caminhar guiados pelo sentimento ou pela vista. Sonhei outra noite, enquanto meditava na vida do crente, que ia percorrendo um caminho que um chamado divino me havia indicado. A trilha estabelecida que eu estava sendo chamado a percorrer se estendia em meio a uma densa escuridão e estava desprovida por completo de algum raio de luz. Quando me encontrava submerso na espantosa escuridão, incapaz de perceber nem uma só polegada diante de mim, ouvi uma voz que me dizia: “segue caminhando. Não temas, antes, avança no nome de Deus”. Assim, prossegui meu caminho, apoiando temerosamente primeiro um pé e logo o outro. Depois de um breve lapso a trilha perdida na escuridão tornou-se fácil e clara, pelo uso e experiência; foi então que percebi que a trilha se retorcia; não tinha escolha, e me esforçava para proceder como havia feito antes; o caminho era agora tortuoso e a senda áspera e pedregosa; mas eu lembrei o que havia sido dito a mim, que precisava avançar como pudesse, assim, segui adiante. Então, veio outro desvio, e logo outro, e outro, e outro, e eu me perguntava por que, até que entendi que se a trama do caminho continuasse sendo a mesma constantemente, acostumar-me-ia a ela, e então caminharia guiado pelo sentimento; e aprendi que a totalidade do caminho seria sempre de tal maneira como para forçar-me a depender da voz condutora e a exercer a fé no Invisível que me havia chamado. Logo me pareceu como se não houvesse nada debaixo do meu pé quando o firmei; contudo, adiantei-o na escuridão, em um confiante atrevimento, e aqui, consegui dar um passo firme, e outro, e outro, enquanto descia por uma escada que baixava cada vez mais verticalmente. Prossegui, sem poder ver nem uma polegada diante de mim, mas crendo que tudo estava bem, ainda que eu pudesse ouvir ao meu redor a estrepitosa queda de homens e mulheres que andavam guiados pela luz de suas próprias lanternas, e que haviam perdido pé. Ouvi os gritos e os alaridos de homens no momento de cair dessa horrenda escada; mas eu tinha ordens de seguir adiante, e segui diretamente até adiante, resoluto a ser obediente ainda se o caminho descesse até o mais profundo inferno.
Logo, a horrenda escada chegou ao fim, e encontrei uma sólida rocha debaixo de meus pés, e caminhei de frente sobre uma calçada elevada com uma balaustrada em ambos os lados. Entendi que isso era a experiência que havia acumulado, que agora podia me guiar e me ajudar, e eu apoiei-me sobre essa balaustrada e segui caminhando, confiantemente, até que, em um instante, minha calçada elevada acabou e meus pés se afundaram na lama, e quanto aos meus outros consolos, buscava-os tateando, mas haviam desaparecido, pois ainda devia saber que tinha que seguir dependendo do meu invisível Amigo, e o caminho seria sempre de tal maneira que nenhuma experiência poderia substituir minha dependência de Deus. Seguindo adiante, sumi no lodo e em uma imundície com um humo sufocante e um odor como de umidade de morte, pois era o caminho, e se me havia ordenado que o percorresse. Novamente a senda mudou, ainda que meia noite; a senda subia, e seguia subindo, e subindo, e subindo, sem nada nela onde pudesse me apoiar; ascendi desfalecente inumeráveis escadas, nenhuma das quais era visível, ainda que o simples pensamento de sua altura pudesse fazer com que o cérebro vacilasse. Imediatamente, irrompeu a luz – quando despertei do meu sonho – e vendo-o desde o alto, vi que tudo era seguro, mas que era um caminho tal que se eu o tivesse visto, não teria podido percorrê-lo jamais. Só na escuridão eu teria podido realizar minha misteriosa travessia; só com uma confiança infantil no Senhor. O Senhor nos guia se estamos dispostos a fazer simplesmente o que Ele nos pedir. Apoiem-se Nele, então. Pintei um pobre quadro, mas ainda assim é um que, se vocês se derem conta, é grandioso para ser contemplado.
Caminhar em frente, crendo em Cristo a cada instante, crendo que os pecados de vocês são perdoados ainda quando sua negrura, crendo que estão seguros, mesmo quando parecer que estão no maior perigo, crendo que estão glorificados com Cristo, quando sentem como se fossem encontrados fora da presença de Deus, esta é a vida da fé.
Ademais, Paulo nota outros pontos de unidade. “O qual me amou”. Bendito seja Deus porque antes que os montes alçassem seus picos coroados de neve até as nuvens, Cristo havia posto Seu coração em nós. Suas “delícias eram com os filhos dos homens”. Em Seu “livro estavam escritas todas aquelas coisas que foram formadas, sem faltar uma delas”. Crente, sujeite-se à preciosa verdade que Cristo o amou eternamente; o todo glorioso Filho de Deus o escolheu, e o desposou, para que pudesse ser sua esposa por toda a eternidade. Temos aqui uma bendita união em verdade.
Observem o que segue: “e entregou a si mesmo por mim”; não só deu tudo o que tinha, mas entregou a si mesmo; não deixou simplesmente de lado Sua glória, Seu esplendor e Sua vida, mas entregou Sua própria pessoa. Oh, herdeiro do céu, Jesus é seu neste momento. Havendo se entregado uma vez por você sobre o madeiro para quitar seu pecado, entrega-se a você neste momento para ser sua vida, sua coroa, seu gozo, sua porção, seu todo em tudo. Você descobriu que é uma personalidade única, e uma individualidade, mas essa personalidade está ligada com a pessoa de Cristo Jesus de maneira que você está em Cristo e Cristo está em você; por uma bendita união indissolúvel, vocês estão entrelaçados pelos séculos dos séculos.
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Fonte: Projeto Spurgeon

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