Por Morgana Mendonça dos Santos
Quando estou dirigindo sempre me deparo
com adesivos desse tipo estampados em carros. O engraçado é que a parte mais
evidente - em letras maiúsculas - são essas: "SERÁ QUE SOU FRACO?"
(exatamente assim). Não parece ser tão importante o fato de ser filho de Deus e
irmão de Jesus. O que vemos nessa frase é mais uma vez a super valorização do
homem acima de Deus e Sua obra.
Quando me refiro ao adesivo, crítico a
forma como fica deturpado o ensino bíblico nesses movimentos
"gospeis". A antropologia precisa ser analisada pelo crivo das
Escrituras, e diante desse padrão nem todos são filhos de Deus e nem irmãos de
Jesus, portanto o adesivo é de fato questionável. No entanto, meu objetivo está
na ênfase dada ao que somos, quando somos filhos de Deus e irmãos de Jesus. A
intenção do autor (desconhecido) nessa frase seria afirmar que somos
"fortes", ou seja, se sou "isso" e "aquilo" sou o
"cara". A ideia egocêntrica continua, por exemplo: "meu valor é
outro", "meu nível é outro", "eu sou o bom".
Essa frase adesivada em vários carros,
de cristãos e não cristãos, têm muito a dizer em relação ao que entendemos
sobre o que somos antes e depois de Cristo. A doutrina da depravação total nos
ensina e nos humilha perante o Criador, quando de fato conhecemos quem somos
entendemos quem Deus é. Quando conhecemos quem somos compreendemos a obra de
Cristo. Antes da regeneração somos conforme diz Romanos 3:
"como está escrito: Não há justo,
nem sequer um. Não há quem entenda; não há quem busque a Deus. Todos se
extraviaram; juntamente se fizeram inúteis. Não há quem faça o bem, não há nem
um só." Romanos 3.10-12.
Como todos podem ser filhos de Deus e
irmãos de Jesus? Está claro que não há ninguém que busque a Deus, ninguém que
faça o bem, a situação é de extravio e inutilidade, não de filiação e
irmandade. Sem a obra da regeneração somos como Paulo continua a dizer,
pecadores e distantes completamente de Deus!
"Porque todos pecaram e destituídos
estão da glória de Deus" Romanos 3.23.
Logo, nem todos são filhos de Deus e
irmãos de Jesus, a razão é pelo fato de que isso não depende de nós, não é por
obras e sim pela graça mediante a fé, que é dom de Deus. Paulo escrevendo para
a igreja em Éfeso diz:
"Ele vos vivificou,
estando vós mortos nos vossos delitos e pecados, nos quais outrora andastes,
segundo o curso deste mundo, segundo o príncipe das potestades do ar, do
espírito que agora opera nos filhos de desobediência, entre os quais todos nós
também antes andávamos nos desejos da nossa carne, fazendo a vontade da carne e
dos pensamentos; e éramos por natureza filhos da ira, como também os
demais." Efésios 2.1-3.
Aqui o sujeito que muda a situação de
morte do homem é Deus (Ele). Nossa condição de morte impede qualquer atitude de
ser alguma coisa sem que Cristo nos vivifique. Éramos por natureza filhos de
Deus? Não! O texto diz: "filhos da ira". Aqui o texto diz que a nossa
vida era "segundo o curso deste mundo", "segundo o
príncipe das potestades do ar". Não segundo Deus, nem Cristo. Portanto, sem
Cristo você e eu estamos mortos, sem vida, condenados a ira de Deus. (João
3.36) No entanto, pela graça de Deus mediante a fé, Deus nos vivifica, nos
tornando membros de sua família.
"Assim, pois, não
sois mais estrangeiros, nem forasteiros, antes sois concidadãos dos santos e
membros da família de Deus". Efésios 2.19.
Nos Evangelhos observamos um momento da
vida de Cristo que Ele declara algo sobre ser membro da família de Deus. A
questão é que somente a obra de Deus nos impeli a obediência da Sua palavra.
"Vieram, então, ter
com ele sua mãe e seus irmãos, e não podiam aproximar-se dele por causa da
multidão. Foi-lhe dito: Tua mãe e teus irmãos estão lá fora, e querem ver-te.
Ele, porém, lhes respondeu: Minha mãe e meus irmãos são estes que ouvem a
palavra de Deus e a observam." Lucas 8.19-21.
Deus nos reconcilia com Ele, em Cristo
nossa situação não é mais a mesma, passamos da morte para a vida, fomos
justificados por Cristo na Sua morte, selados por Ele e redimidos.
"A vós também,
que outrora éreis estranhos, e inimigos no entendimento pelas vossas obras más,
agora contudo vos reconciliou no corpo da sua carne, pela morte, a fim de
perante ele vos apresentar santos, sem defeito e irrepreensíveis". Colossenses 1.21-22.
A grande questão desse adesivo é que se
Deus nos escolheu para adoção, nos chamou como filhos amados, em obediência a
palavra somos membros do seu corpo, sua família e seu povo, o que deveríamos
declarar era: "Sou filho de Deus e irmão de Jesus, será que eu
mereço?" Porque de fato, a questão não é "se sou fraco" no
sentido "sou o cara", mas a verdadeira ênfase é no que Deus é e o que
Ele faz.
Calvino, nas Institutas, no capítulo
I.2 declara que o conhecimento de Deus nos conduz ao conhecimento de nós mesmo e
vice-versa:
"Por outro lado, é notório que o
homem jamais chega ao puro conhecimento de si mesmo até que haja antes
contemplado a face de Deus, e da visão dele desça a examinar-se a si próprio. Ora,
sendo-nos o orgulho a todos ingênito, sempre a nós mesmos nos
parecemos justos, e íntegros, e sábios, e santos, a menos que, em virtude de
provas evidentes, sejamos convencidos de nossa injustiça, indignidade, insipiência
e depravação.
Não somos, porém, assim convencidos, se atentamos apenas para nós mesmos e
não também para o Senhor, que é o único parâmetro pelo qual se deve aferir
este juízo. Pois, uma vez que somos todos por natureza propensos à
hipocrisia, por isso qualquer vã aparência de justiça nos satisfaz amplamente em lugar da
real justiça. E
porque dentro de nós ou a nosso derredor nada se vê
que não seja contaminado de crassa impureza, por todo tempo que confinamos
nossa mente aos limites da depravação humana, aquilo que é um pouco
menos torpe a nós nos sorri como coisa da mais refinada pureza. Exatamente
como se dá com um olho diante do qual nada se põe de outras cores senão o
preto: julga-se alvíssimo o que, entretanto, é de brancura um tanto esfumada,
ou até mesmo tisnado de certa tonalidade fosca".
Em suma, devemos conhecer a Deus e
seremos confrontados com quem realmente nós somos, agradecidos por não merecer
tal filiação e menos ensoberbecidos de nos considerar acima Dele ou de alguém,
não somos merecedores, no entanto Ele nos escolheu. Por isso, devemos ser
santos e irrepreensíveis, pois, somos membros de Sua família!
A Deus toda glória, Rm 11.36.