"Está alguém entre vós doente? Chame os
presbíteros da igreja, e estes façam oração sobre ele, ungindo-o com óleo, em
nome do Senhor” (Tg 5.14)
A partir do estudo desta passagem, o Supremo Concílio da Igreja Presbiteriana do Brasil acabou de aprovar a “unção com óleo”. A decisão diz o seguinte:
A partir do estudo desta passagem, o Supremo Concílio da Igreja Presbiteriana do Brasil acabou de aprovar a “unção com óleo”. A decisão diz o seguinte:
1) Reafirmar que Deus é soberano para atender ou não, aos pedidos nas orações, segundo sua suprema
vontade, independente da fé do crente. 2) Determinar aos pastores e presbíteros
que não unjam pessoas ou objetos com óleo durante cultos de qualquer natureza,
públicos ou em casas, quer sejam reuniões ou encontros em quaisquer lugares. 3)
Permitir excepcionalmente que a unção com óleo seja realizada, exclusivamente
em pessoas, nunca em objetos, pelos pastores e presbíteros somente quando forem
convidados por membros enfermos de suas igrejas, em suas casas, orando por eles
e suplicando de Deus o seu pronto restabelecimento.4) Que a exceção mencionada
no item anterior fica à discrição dos pastores e presbíteros das igrejas locais
uma vez certificados de que o enfermo crente, não atribui poderes miraculosos
ao óleo e também que seu emprego não irá gerar superstições e misticismo”.
Sem dúvida, a
questão da unção com óleo é complexa e não é nosso objetivo repudiar a decisão
do Supremo Concílio, a qual tentou fazer justiça ao texto bíblico, e,
provavelmente fez, na medida do possível. Nosso objetivo aqui é ponderar algumas
observações que, talvez, lancem mais luz sobre o assunto e nos ajudem ver a
questão sob outro ângulo.
Inicialmente, é
preciso dizer que, provavelmente, o principal equívoco em relação à
interpretação do texto de Tiago seja a preocupação com o óleo em si mesmo,
desconsiderando o contexto em que ele foi utilizado. Há muito esforço por parte
de alguns estudiosos para dizer que trata-se de um óleo medicinal, o qual seria
utilizado como uma espécie de remédio. Nesse caso, a interpretação é falha
porque o próprio texto parece negar o poder do “óleo" de curar, dizendo
antes que “a oração da fé” salvará o enfermo.
Por outro lado,
há um esforço por parte de outros especialistas em desqualificar o próprio
óleo, focalizando mais na importância da oração, tornando o óleo algo opcional.
É óbvio que a oração é fundamental, e ela, segundo Tiago, levantará o enfermo,
mas a questão aqui é que pouco adianta tentar enfraquecer o uso do termo óleo,
pois a ordem de utilizá-lo está no texto, e não podemos removê-la. É preciso
lembrar que todo o texto ordena que se faça isso, usando verbos imperativos, e
nesse sentido, o Supremo Concílio foi coerente, pois não quis proibir algo que
claramente é “mandado fazer” na Escritura.
O ponto,
provavelmente, que precisaria ser mais trabalhado é justamente o contexto da
afirmação de Tiago. Notamos que a preocupação maior dos intérpretes está em
definir o tipo de óleo ou o caráter terminológico da palavra “ungir”, e pouca
atenção é dada às palavras “doente" e “enfermo”. Estariam elas realmente
falando de doença física?
Tiago orienta:
"Está alguém entre vós doente?”. A palavra “doente" é astheney (ἀσθενεῖ), a qual,
prioritariamente tem o sentido de “fraco”, “débil”. A palavra é aplicada desse
modo, denotando “fraqueza espiritual” em várias passagens do Novo Testamento.
Em Romanos 14.1, Paulo usa essa palavra para falar do irmão “fraco” na fé. Em
1Coríntios 8.7, Paulo fala de pessoas que têm uma “consciência fraca”,
utilizando essa mesma palavra. Evidentemente, o termo pode ser aplicado para
doença física, mas para isso, o contexto precisa ser claro. E não parece ser
esse o caso do contexto de Tiago 5.
O contexto de
Tiago 5 está evocando o perigo do pecado que acarreta juízo de Deus e, ao mesmo
tempo, o modo como alguém pode ser resgatado desse pecado através do
arrependimento e da oração por parte da igreja. No verso 11, Tiago elogiou
aqueles que “perseveram firmes”, ou seja, que não se deixaram desviar dos
caminhos de Deus, mesmo sob intenso sofrimento, e menciona o exemplo de Jó para
isso. Porém, infelizmente, nem todos conseguem ser firmes e perseverantes como
Jó, e Tiago sabe disso.
No verso 12, ele
faz uma advertência formal: “Acima de tudo, porém, meus irmãos, não jureis nem
pelo céu, nem pela terra, nem por qualquer outro voto; antes, seja o vosso sim
sim, e o vosso não não, para não cairdes em juízo”. Portanto, ele parece estar
mencionando alguma situação específica de perjuro entre os crentes, e
relembrando o ensino do Senhor para que evitassem juramentos formais, mantendo
apenas o padrão da verdade através de respostas simples: sim, sim; ou, não,
não. Ou seja, um crente não pode viver "aquém" daquilo que a Palavra
ensina, pois a fé sem obras é morta (Tg 2.26), mas também não deve ir “além”.
Um excesso de rigor pode levar o crente a uma vida de legalismo, e,
consequentemente, de uma fé morta pelo caminho oposto. De qualquer modo, Tiago
está alertando o crente a evitar ser atingido pelo juízo de Deus por causa de
um pecado que lhe cause uma queda espiritual.
Nesse contexto
ele diz: “Está alguém entre vós sofrendo? Faça oração. Está alguém alegre?
Cante louvores” (Tg 5.13). “Sofrendo" é a tradução da palavra kakopathia
(Κακοπαθεῖ), e literalmente significa “sentimento mau”. A
ideia é de um sentimento de aflição. Ou seja, se alguém está aflito,
provavelmente em decorrência das pressões do mundo, deve fazer oração. Por
outro lado, se está livre disso, ou seja, se mesmo enfrentando o sofrimento e a
tribulação impostos pelo mundo, continua “animado” (εὐθυμεῖ), então deve
“cantar salmos” (ψαλλέτω). Nisso percebemos que ele está descrevendo situações
emocionais e, ou, espirituais. Não se tratam de aspectos físicos, mas de
estados de espírito, ou seja, o contexto se encaixa mais numa descrição de uma
“doença espiritual”.
Então, temos os
versos 14-15: "Está alguém entre vós doente? Chame os presbíteros da
igreja, e estes façam oração sobre ele, ungindo-o com óleo, em nome do Senhor.
E a oração da fé salvará o enfermo, e o Senhor o levantará; e, se houver
cometido pecados, ser-lhe-ão perdoados”. Ou seja, se alguém está “débil"
na fé (oposto de animado), possivelmente por alguma situação de pecado que
gerou um “desvio” espiritual, essa pessoa deve chamar os presbíteros da igreja,
e eles devem ungi-la com óleo, e orar por ela. Consequentemente, a oração da fé
“salvará o enfermo”. Essas duas palavras são muito importantes. “Salvará” no
texto grego é σώσει (sósei). O termo típico para salvação de pecados. E enfermo
é κάμνοντα (kamnonta) que tem o sentido primário de “exaustão”. Portanto, o
Senhor “salvará o desanimado”. É claro que todos esses termos podem ser
aplicados a “doença física”, mas o assunto de Tiago não é “doença física” e sim
“doença espiritual”. Ele está falando, provavelmente, de uma pessoa que pecou
gravemente, se afastou dos caminhos de Deus, porém, ao ser tocada pelo
arrependimento, deseja voltar, mas não tem forças. Assim, os presbíteros devem
formalmente ir até ela, orar por ela e ungi-la. Assim, formalmente, o pecado
cometido fica perdoado diante de Deus e dos homens. Nesse caso, o óleo é o
símbolo do Espírito Santo renovando a vida espiritual desse pecador.
Que o assunto é esse, fica ainda mais claro na sequência do texto: “Confessai, pois, os vossos pecados uns aos outros e orai uns pelos outros, para serdes curados. Muito pode, por sua eficácia, a súplica do justo” (Tg 5.16). Ou seja, o pecador deve confessar seu pecado e receber oração formal, assim, é reconduzido à comunhão da igreja.
Que o assunto é esse, fica ainda mais claro na sequência do texto: “Confessai, pois, os vossos pecados uns aos outros e orai uns pelos outros, para serdes curados. Muito pode, por sua eficácia, a súplica do justo” (Tg 5.16). Ou seja, o pecador deve confessar seu pecado e receber oração formal, assim, é reconduzido à comunhão da igreja.
Sobre a pergunta
que poderia surgir, ou seja, se homens pecadores poderiam fazer isso por outros
pecadores, Tiago responde com o exemplo de Elias: “Elias era homem semelhante a
nós, sujeito aos mesmos sentimentos, e orou, com instância, para que não
chovesse sobre a terra, e, por três anos e seis meses, não choveu. E orou, de
novo, e o céu deu chuva, e a terra fez germinar seus frutos” (Tg 5.17-18).
Portanto, nisso está a eficácia da oração do justo. Não é a ideia de perfeição
de quem está orando, pois Elias é citado aqui como “sujeito aos mesmos
sentimentos”, mas sua oração foi ouvida por Deus. A metáfora de “abrir o céu” e
“fechar o céu”, no caso de Elias, fica ainda mais significativa. Quando os
presbíteros oram para que Deus restaure o pecador arrependido, isso tem uma
correspondência direta com o que é decidido no céu. Em situação semelhante evocando
disciplina, restauração e perdão de pecados, no famoso Mateus 18, Jesus disse:
"Em verdade vos digo que tudo o que ligardes na terra terá sido ligado nos
céus, e tudo o que desligardes na terra terá sido desligado nos céus” (Mt
18.18).
Os dois últimos
versículos do capítulo e do livro de Tiago não deixam dúvida de que o assunto é
“perdão de pecados”: “Meus irmãos, se algum entre vós se desviar da verdade, e
alguém o converter, sabei que aquele que converte o pecador do seu caminho
errado salvará da morte a alma dele e cobrirá multidão de pecados” (Tg
5.19-20).
Portanto, em que situação a carta de Tiago autoriza os presbíteros a utilizarem o óleo? Para ungir qualquer doente? Parece-nos que não. A prática desse ato pode facilmente conduzir aos abusos e a uma consideração idolátrica do óleo. Formalmente, os presbíteros poderiam utilizar o óleo para ungir um pecador arrependido, que cometeu um pecado grave e se desviou do caminho de Deus (talvez perjuro), porém arrependido deseja voltar, mas não tem forças espirituais para isso. Então, formalmente, os presbíteros vão até ele quando chamados, oram por ele, ungem-no com óleo, simbolizando a restauração espiritual através do Espírito Santo, e confiam que seu ato realizado na terra foi confirmado no céu. Isso retira qualquer "poder" de cura do óleo em si mesmo, e estabelece-o como um símbolo da ação restauradora do Espírito Santo.
Portanto, em que situação a carta de Tiago autoriza os presbíteros a utilizarem o óleo? Para ungir qualquer doente? Parece-nos que não. A prática desse ato pode facilmente conduzir aos abusos e a uma consideração idolátrica do óleo. Formalmente, os presbíteros poderiam utilizar o óleo para ungir um pecador arrependido, que cometeu um pecado grave e se desviou do caminho de Deus (talvez perjuro), porém arrependido deseja voltar, mas não tem forças espirituais para isso. Então, formalmente, os presbíteros vão até ele quando chamados, oram por ele, ungem-no com óleo, simbolizando a restauração espiritual através do Espírito Santo, e confiam que seu ato realizado na terra foi confirmado no céu. Isso retira qualquer "poder" de cura do óleo em si mesmo, e estabelece-o como um símbolo da ação restauradora do Espírito Santo.