João
Calvino frequentemente instruiu sua congregação sobre ouvir corretamente a
palavra de Deus. Ele os ensinava como deveriam vir para o culto público e como
ouvir a palavra de Deus pregada. Calvino desejava que pais e filhos
assimilassem a importância da pregação para desejar a pregação como uma benção
suprema e participar ativamente no sermão. Calvino dizia que os ouvintes deviam
ter “a prontidão para obedecer completamente e sem reservas”.[1]
Calvino
acentuava o ouvir da palavra pregada por duas importantes razões. Primeiro, ele
acreditava que poucas pessoas ouviam bem os sermões. Mais de trinta vezes em
seus comentários e nove vezes em suas Institutas, Calvino referiu-se a quão
poucas pessoas recebem a palavra pregada com fé salvífica. Ele disse: “Se o
mesmo sermão for pregado, digamos, a cem pessoas, vinte o recebem com pronta
obediência de fé, enquanto o restante o julga sem valor, ou ri, ou vaia ou o
aborrece”.[2] Se ouvir apropriadamente era um problema nos dias de Calvino,
quanto mais o é hoje, quando os ministros têm que competir pela atenção de
pessoas que são diariamente bombardeadas de várias formas pela mídia?
Segundo,
Calvino destacou o ouvir adequado, por causa do seu alto respeito pela
pregação. Calvino via a pregação como um meio que Deus usa para outorgar
salvação e benção. Calvino disse que o Espírito Santo é o ministro interno que
utiliza o “ministro externo” da palavra pregada. O ministro externo
“prega a Palavra vocalmente e ela é recebida pelos ouvidos”, mas o ministro
interno “verdadeiramente comunica a coisa proclamada, [que] é Cristo”.[3] Assim,
Deus fala pela boca dos seus servos pelo seu Espírito: “Onde quer que o
evangelho seja pregado, é como se o próprio Deus viesse para o meio de nós”.[4] A
pregação fiel é o meio pelo qual o Espírito faz sua obra salvífica de iluminar,
converter e salvar pecadores. Calvino disse: “Existe... uma eficácia interior do
Espírito Santo quando ele derrama o seu poder sobre os ouvintes, para que eles
possam compreender um discurso [sermão] pela fé”. [5]
Como
Calvino, os Puritanos tinham um alto respeito pela pregação. Como amantes da
Palavra de Deus, os puritanos não se contentavam com meramente afirmar a
infalibilidade, inerrância e autoridade da Escritura. Eles também liam,
investigavam, pregavam, ouviam e cantavam a Palavra com deleite, buscando o
poder aplicador do Espírito Santo que acompanhou a Palavra. Eles consideravam
os sessenta e seis livros da Escritura sagrada como a biblioteca do Espírito
Santo. Para os Puritanos a Escritura era Deus falando ao seu povo como um pai
fala aos seus filhos. Na pregação Deus dá a Palavra como verdade e poder. Como
verdade, a Escritura pode ser confiável para hoje e para a eternidade. Como
poder, a Escritura é o instrumento de transformação usado pelo Espírito de Deus
para renovar nossas mentes.
Como
protestantes evangélicos do século vinte e um, devemos combinar nossa defesa da
inerrância bíblica com uma demonstração positiva do poder transformador da
Palavra de Deus. Esse poder deve ser manifestado em nossas vidas, nossos lares,
nossas igrejas e nossas comunidades. Nós devemos mostrar que, embora outros
livros possam nos transformar ou mesmo nos reformar, apenas um livro pode nos
transformar, conformando-nos à imagem de Cristo. Apenas como “cartas vivas de
Cristo” (2 Co. 3.3) podemos esperar vencer a batalha pela Bíblia em nossos
dias. Se gastarmos o máximo da nossa energia em conhecer e viver as Escrituras,
quantas pessoas mais cairiam sob o domínio do seu poder transformador?
O
movimento puritano nos ensina mais sobre cultivar o poder transformador da
Palavra. Os pregadores puritanos explicavam claramente como a Palavra efetuava
transformação pessoal. Eles ofereciam direção prática sobre como ler e ouvir a
Palavra de Deus.[6] O Catecismo Maior de Westminster resume tal informação
Puritana na pergunta 160:
“Exige-se
dos que ouvem a pregação da Palavra, que eles a acolham com perseverança,
preparação e oração; que comprovem o que ouvem com as Escrituras; recebam a
verdade com fé, amor, mansidão e ânimo pronto, como a Palavra de Deus; que nela
meditem e sobre ela conversem; que a escondam no coração e manifestem os seus
frutos em suas vidas”.[7]
Em
associação com Lucas 8:18, “vede, pois, como ouvis”, oferecerei alguns ensinos
Puritanos junto com os quais as minhas próprias observações sobre ouvir a
Palavra de Deus, dividindo o assunto em três pensamentos: Como se preparar para
a Palavra pregada, como receber a Palavra pregada e como praticar a Palavra
pregada. Enquanto estudamos cada ponto, devíamos nos perguntar: Estou realmente
ouvindo a Palavra de Deus? Sou um bom ouvinte do evangelho proclamado ou sou
apenas um ouvinte crítico ou descuidado? Percebo, disse Charles Simeon, que
todo sermão “aumenta nossa salvação ou nossa condenação”? [8] Estou ensinando aos
meus filhos como serem bons ouvintes?
_____
Extraído
do livro “A Família na Igreja — Ouvindo os Sermões e Assistindo as Reuniões de
Oração”, Joel Beek; A ser lançado pela Editora Os Puritanos.
1 Leroy Nixon, John Calvin, Expository Preatcher
(Grand Rapids: Eerdmans, 1950, 65.
2 John Calvin, Institutes of the Christian
Religian, ed. John J. McNeill, trans. Ford Lewvis Battles (Philadelphia:
Westminster Press, 1960), 3.24.12.
3 John Calvin, Tracts and Treatises, trans. Henry
Beveridge (Grand Rapids: Eerdmans, 1958), 1:173.
4 John Calvin, Commentary on the Synoptic Gospels
(Edinburgh: Calvin Translation Societyy, 1851), 3: 129).
5 Commentary on Ezekiel, 1:61.
6 Samuel Annesley, “How May We Give Christ a
Satisfying Account [of] Why we Attend upon the Ministry of the Word?,” in
Puritan Sermons 1659-1689, Being Morning Exercises at Cripplegate (Wheaton,
Ill.: Richard Owen Roberts, 1981),4:173198; David Clarkson, “Hearing the Word,”
The Works of David Clarkson (Edinburgh: Banner of Truth Trust, 1988),
1:428-446; Thomas Manton, “The Life of Faith in Hearing the Word,” The Complete
Works of Thomas Manton (London: James Nisbet, 1873), 15:154-74; Jonathan
Edwards, “Profitable Hearers of the Word,” The Works of Jonathan Edwards:
Sermons and Discourses 1723-1729, ed. Kenneth P. Minkema (New Haven: Yale,
1997),14:243-77; Thomas Senior, “How We May Hear the Word with Profit,” in Puritan
Sermons, 2:47-57; Thomas Watson on hearing the Word effectually, A Body of
Divinity (Grand Rapids: Sovereign Grace Publishers, 1972), 377-80; three short
pieces by Thomas Boston, The Complete Works of the Late Rev. Thomas Boston
(Wheaton, Ill.: Richard Owen Roberts, 1980), 2:427-454; Thomas Shepard’s
“OfIneffectual Hearing the Word,” The Works of Thomas Shepard (Ligonier, Penn.:
Soli Deo Gloria, 1992), 3:363-84. Várias fontes do século dezenove permanecem
na tradição puritana: uma carta de John Newton intitulada “Hearing Sermons”,
The Work of John Newton (Edinburg: Banner of Truth Trust, 1985), 1:218–25; um
ensaio de John Elias intitulado: “On Rearing the Gospel”, John Elias
intitulado: Life, Letters and Essays (Edinburgh: Banner of Thuth Trust, 1973)
356–360; e o tratamento mais completo e útil, Edward Bickersteth, The Christian
Hearer (London: Seeleys, 1853).
7 Westminster Confession of Faith (Glasgow: Free
Presbyterian Publications, 1997), 253.
8 Charles Simeon, Let Wisdom Judge:
University Adresses and Sermon Outlines (Nottingham: Inter-Varsity Fellowship,
1959, 19.
___________________
Fonte: Os Puritanos