Por Thiago Oliveira
Agostinho, no século IV,
desenvolve a sua teologia após mergulhar profundamente nos escritos de Paulo. O
resultado de seus estudos hermenêuticos e exegéticos renderam-lhe o título,
póstumo, de Doutor da Igreja. Agostinho de início produziu textos para refutar
o dualismo dos maniqueístas, grupo do qual chegou a fazer parte, nos primeiros
anos de conversão. Porém, a sua mais valiosa contribuição é aquela voltada para
refutação do pelagianismo. A grande controvérsia entre Pelágio e Agostinho
envolviam o livre-arbítrio e o pecado original.
Segundo Pelágio, a
humanidade não foi afetada pelo pecado de Adão, este só prejudicou a si
próprio. De acordo com essa heresia, o primeiro homem foi criado neutro, com
uma vontade livre para escolher o bem ou o mal. Adão, ainda segundo Pelágio, já
estava condicionado a ser mortal, sendo assim, a morte não foi uma consequência
desastrosa do seu pecado. O mesmo acredita que todos os homens nascem com a
mesma condição de neutralidade.
Daí o livre-arbítrio, de
acordo com o conceito pelagiano, pode ser assim entendido: Dentro de suas
próprias capacidades, o homem poderia voltar do mal para o bem, isto é, de uma
condição de pecador para uma condição de santo, sem precisar de nenhuma intervenção
divina. Isto anula, então, a ação do Espírito Santo, além, obviamente, de
anular a obra de Cristo na cruz.
A refutação de Agostinho
baseia-se, sobretudo, na epístola aos Romanos. Ele afirma que Após a catástrofe
do Éden, a humanidade herda um pecado voluntário, que escraviza o homem em seu
desejo de querer pecar mais e mais. Sendo assim, o pecado coíbe o homem de
escolher aquilo que é inerentemente bom. Dessa maneira, o homem degenerado é
incapaz de escolher não pecar. Somente através da iniciativa Divina, o pecador
é regenerado. É uma obra exclusiva de Deus a renovação da vontade humana. Ele
atua soberanamente na salvação e na santificação do homem pecador.
O ensino agostiniano é o
de que a graça não viola a característica do ser humano como se este não fosse
um agente livre, mas sim que, ela reconstrói o livre-arbítrio perdido na Queda,
ao ponto que o pecador regenerado agora é capaz de voltar-se para Deus. A graça
não é concedida porque alguém tem fé, mas sim, para que se tenha fé. A graça
que atua no homem depravado e o santifica é concedida a todo aquele que foi por
Deus predestinado para a salvação.
Após o embate entre
Pelágio e Agostinho, a Igreja Católica, o pelagianismo é considerado herético e
repudiado no Concílio de Éfeso, no ano de 431. Surge então uma linha
intermediária, que tentava conciliar o livre-arbítrio e a soberania de Deus.
Defendida veementemente por João Cassiano e abraçado pelos Sínodos de Arles
(471) e Lyons (475), o semipelagianismo pode ser assim resumido:
- O pecado de Adão manchou
o homem, mas não totalmente (Depravação Parcial).
- O homem estava livre
para escolher ou não pecar.
- A salvação é meritória.
- Tenta conciliar a
Eleição e o Livre-Arbítrio.
- Em suma: A salvação
provém da graça divina, mas conta com a participação humana.
Embora tenha sido
condenado em 529, no Sínodo de Orange o pensamento medieval concernente a
salvação estava próximo dessas ideias. Todavia, a posição oficial da igreja
estava mais para o que podemos chamar de semiagostinianismo, como nos diz R.C.
Sproul. Ela afirmou que a capacidade para fazer o bem procede da graça, a graça
concedida na regeneração.
No entanto, a
predestinação e a graça irresistível foram mais ou menos omitidas nos
pronunciamentos dos sínodos. Para a Igreja Católica, a graça da regeneração é
efetivada pelo sacramento do batismo. A regeneração batismal foi,
posteriormente, rejeitada pelos calvinistas e também pela maioria dos outros
segmentos do protestantismo. A soteriologia medieval na prática de muitos
clérigos, incluindo papas, abraçou o que a própria Igreja havia condenado (o
pelagianismo e o semipelagianismo), além de atenuarem o ensino de Agostinho.