Antes de mais
nada, precisamos definir “Apologética”. Pois bem, esta palavra significa “defesa
verbal”. Quando falamos em Apologética, quase sempre nos referimos a defesa do
Evangelho, pois foi no Cristianismo que ela foi desenvolvida. Os apologistas
foram aqueles que de maneira sistemática, explanaram e demonstraram o Evangelho
como sendo uma fé digna de credibilidade, autenticidade e superioridade com
relação as demais religiões. Atualmente, as redes sociais disseminaram as
práticas apologéticas, sobretudo, em páginas e blogs de confissão reformada,
todavia, existe algo preocupante no tipo de apologética que encontramos na
websfera.
Defender a fé é
uma recomendação bíblica. Mas, gostaria muito que nós pudéssemos meditar nas seguintes
palavras do apóstolo Pedro:
“Antes, santificai a Cristo, como Senhor,
em vosso coração; e estai sempre preparados para responder com mansidão e temor
a qualquer que vos pedir a razão da esperança que há em vós” 1 Pedro
3.15
A primeira
coisa a que chamo a atenção é o fato de que antes de defendermos o Evangelho,
Cristo precisa ser santificado (i.é. separado) como o Senhor do nosso coração,
local de onde procedem as fontes da vida (Pv 4.23). Cristo deve ter o domínio
daquilo que pensamos e também deve dominar sobre a nossa conduta. Então, sendo
Ele o Senhor, toda a honraria deve ser dada somente para Ele. Lembremos do
louvor paulino(Rm11.36): “Porque dele e por ele, e para ele, são todas as
coisas; glória, pois, a ele eternamente. Amém”.
Tendo
Cristo o domínio de nosso ser e da nossa prática, estaremos prontos para
responder a qualquer um que nos indagar acerca de nossa esperança. O termo “qualquer”,
usado por Pedro, é inclusivo e nos remete a todo tipo de circunstância. Desde a
defesa perante um tribunal, num contexto de perseguição ao Evangelho, ou até mesmo
uma resposta para um detrator da Palavra ou para alguém que verdadeiramente
anseie escutar sobre as boas-novas, ou melhor, escutar sobre a esperança que
temos em nosso Salvador, no qual cremos piamente que estamos nEle guardados e
salvos da ira vindoura que recairá sobre os pecadores no dia do Juízo.
Todavia, a
nossa resposta deve ser dada com mansidão. Aqui temos que novamente nos
reportar para a santificação de Cristo em nossos corações. Pois, se Ele foi
manso (Mt 11.29), porque então nós haveríamos de ser diferentes? Estaria o
servo acima de seu Senhor? Absolutamente, não! No entanto esta mansidão tem
faltado entre aqueles que dizem ter zelo pela sã doutrina. Diversos fóruns em blogs e
redes sociais mostram a cólera com que irmãos tratam irmãos. Não falo nem da
relação do cristão com um não-cristão. Basta ser de uma denominação ou corrente
teológica diferente para vermos um verdadeiro “bang-bang”. Homens que querem
vencer seu oponente em argumentos, muitas vezes, para satisfazer seu ego e não para glorificar a Deus.
Alguns destes
irascíveis costumam citar Paulo como se a atitude do apóstolo coadunasse com o
descabido furor que exalam pelos quatro cantos. Mas, seria mesmo Paulo alguém
que defendia o Evangelho com agressividade? Vejamos o que ele ensina:
Em Colossenses
4.6 ele afirma que “a vossa palavra seja sempre agradável, temperada com sal,
para que saibais como vos convém responder a cada um.” Aqui o apóstolo alerta
que o modo de se falar é tão importante quanto o conteúdo. A figura de
linguagem utilizada, temperar com sal, remete a uma tradução rabínica de tratar
a Torá como o sal, conservante da pureza, que torna o alimento agradável ao
paladar. Precisamos evitar os extremos. Uma comida insossa é ruim, tal como uma
comida muito salgada. É preciso então equilibrar a balança, saber quando e como
devemos falar do Evangelho, não para ganhar uma discussão, este nunca foi o
objetivo paulino, mas sim para ganharmos as pessoas para a Verdade. Para que
tenhamos êxito na nossa apologética, é extremamente necessário termos respeito
e amabilidade para com o nosso próximo, por mais equivocado que ele esteja. Não
quer dizer que devemos aceitar seu erro e sermos indulgentes. Digo apenas que
devemos instruir com amabilidade e (porque não?) gentileza.
Os dois
primeiros versículos de Romanos 15 nos dizem que os fortes devem suportar a
fraqueza dos fracos. Força e fraqueza nesse contexto tem a ver com o
conhecimento que adquirimos sobre Deus no decorrer da caminhada com o Senhor.
Sabemos que este conhecimento não é meramente intelectual, pois existe aqui o
conceito revelacional. Deus se revela a quem Ele bem quer e a uns Ele concede
mais compreensão do que a outros. Cabe aqueles a quem muito foi dado, não se
utilizarem dessa dádiva para se vangloriar ou agradar a si mesmos. Aos mais dotados
de percepção das doutrinas bíblicas, que cumpram o trabalho de edificar os mais
fracos nas questões da fé. Aqui a fraqueza envolve intelectualidade e, também, moralidade. Todavia, Paulo não nos instrui a tolerar os erros dos que denomina
fracos. Ele lança a ideia de suportar, ou seja, conduzir em amor, estes irmãos,
mesmo em suas fraquezas, para que eles sejam posterior e sistematicamente
edificados no Corpo de Cristo.
É justamente
neste ponto que vejo o quão distante estamos da recomendação apostólica de
suportarmos uns aos outros em amor (Ef 4.2). Será mesmo que uma postagem de
Facebook é um local ideal para a correção? Ali onde as palavras não tem feição
e portanto aparentam ser mais frias do que deveriam ser, tentamos convencer irmãos,
travestidos de oponentes, a pensarem de maneira coerentemente bíblica. Acontece
que, quando somos impiedosos, desproporcionalmente debochados e intelectualmente
vaidosos, não podemos cobrar coerência de ninguém. Façamos uma auto-análise.
Ainda usando um texto de Paulo, este quando escreve para Timóteo, dá a seguinte recomendação:
“E rejeita as questões loucas, e sem
instrução, sabendo que produzem contendas. E ao servo do Senhor não convém
contender, mas sim, ser manso para com todos, apto para ensinar, sofredor; instruindo
com mansidão os que resistem, a ver se porventura Deus lhes dará arrependimento
para conhecerem a verdade, e tornarem a despertar, desprendendo-se dos laços do
diabo, em que à vontade dele estão presos.” 2 Timóteo 2.23-26
Esta passagem é
fantástica. Paulo diz ao seu discípulo e filho na fé, que ele deve ser manso e
não andar contendendo sobre coisas supérfluas. Vejo irmãos se engalfinhando por
questões tais como: supra ou infralapsarianismo, batismo por imersão ou aspersão
e etc. Não existe aqui uma regra para que não se debata sobre estes
determinados assuntos. O que existe é uma recomendação para que estes não
venham a ser encarados como coisas estritamente necessárias a comunhão, e que
não causem divisões entre os membros do corpo de Cristo. Timóteo, mesmo diante
dos sectários e hereges, tinha que “instruir com mansidão”. Atentemos ao fato
que a mansidão é para os que persistem no erro (v.25). Na disciplina pode haver
brandura. Ela deve estar atrelada a paciência e ao desejo de ver o arrependimento
brotar do coração daquele que estava obstinado a permanecer no erro para que
tornem a despertar, libertando-se dos laços diabólicos no qual estão presos.
Outra bela
passagem bíblica que nos encoraja a sermos mais piedosos em nossa apologética
se encontra em Judas 22 e 23: “E
apiedai-vos de alguns, usando de discernimento; E salvai alguns com temor,
arrebatando-os do fogo, odiando até a túnica manchada da carne.”
Judas escreve
aos seus leitores que eles devem ajudar aos crentes que não tem muito
discernimento da Palavra, e que por isso chegam a duvidar dela. Qualquer um de nós
conhece esse tipo de crente vacilante, que quando se depara com um questionamento
cético fica com a sua crença abalada. Portanto, segundo nos diz o apóstolo, é
necessário conduzir estes duvidosos para que estes voltem a crer. Uma outra
categoria de pessoas a que Judas se refere, são os pecadores que estão
perecendo. Ele utiliza a figura do fogo consumindo os pecadores e diz que nós
deveríamos prontamente salvá-los das chamas. Mas não é Deus quem salva o
pecador? Logicamente, a ideia aqui não é colocar a salvação em nossas mãos como
sendo autores delas, todavia, somos ministros, por Deus comissionados a
anunciar a Palavra da Salvação, como bem frisou Calvino. O termo final “odiando até a túnica manchada da carne” é uma admoestação para não
nos contaminarmos com o pecado, comparado aqui com roupas sujas de excremento.
Do pecado precisamos tomar distância, no entanto, devemos nos aproximar dos
pecadores. Foi exatamente isto que Jesus fez durante todo o seu ministério.
Depois de
analisarmos estas passagens bíblicas, não nos resta dúvida de que devemos
abandonar a síndrome de “Dr. Jekyll”, um clássico personagem da literatura (O
Médico e o Monstro) que ao tomar uma poção criada em laboratório se
transformava num ser monstruosamente descontrolado. As queixas são muitas.
Estou cansado de ver pessoas que foram destratadas em páginas e blogs que se
dizem apologéticas. Há um desserviço a causa do evangelho toda vez que, por
exemplo, um calvinista ofende um arminiano e vice-versa. Precisamos parar de
proceder como loucos e aprender de Cristo, que foi manso e suave.
A Verdade deve
sempre ser dita e continuemos a combater os falsos ensinamentos que vem sendo
propagados, agora em velocidade recorde devido ao avanço dos meios de
comunicação. Todavia, esse combate não pode ser feito de maneira irresponsável
ao ponto de andarmos na contramão do que as Escrituras estabelecem com relação
a apologética. Vamos acabar de vez com esse “bang-bang” e promover o Reino com
amor e humildade. Nada é nosso, tudo é dEle.
Soli Deo
Gloria.