Por Vincent Cheung
Escrevo-lhe estas coisas, embora
espere ir vê-lo em breve; mas, se eu demorar, saiba como as pessoas devem
comportar-se na casa de Deus, que é a igreja do Deus vivo, coluna e fundamento
da verdade.
(1 Timóteo 3.14-15)
Paulo
chama a igreja de “coluna e fundamento da verdade”. Isso nos diz, não o que a
igreja deve ser, mas o que a igreja é. A importância dessa distinção se tornará
mais clara depois, mas primeiro devemos considerar se as duas metáforas estão
sujeitas a mau entendidos.
Alguns
escritores preocupam-se que as metáforas “coluna” e “fundamento” podem dar às
pessoas a impressão que a igreja é a própria fonte e base da verdade. Contudo,
toda a Escritura testifica contra isso, e por isso eles estão interessados em
expor o versículo de uma forma que evite a falsa interpretação.
Dessa
forma é tido que a metáfora da “coluna” é feita no contexto da arquitetura
antiga. Um templo pagão, por exemplo, pode incluir várias colunas de ornamento
que servem não somente para sustentar a estrutura, mas para demonstrar a
riqueza e glória associada com a divindade. Os escritores parecem mais
preocupados com a metáfora do “fundamento”, e sugerem que uma tradução melhor
seria “baluarte” ou “esteio”. Isto é, a igreja não é o próprio fundamento da
verdade, mas apenas seu protetor.
O
problema tem sido exagerado. Não somos católicos que tentam distorcer palavras
e frases individuais da Escritura para justificar suas doutrinas inventadas por
homens. Somos cristãos que respeitam o todo da Escritura, e leem palavras e
frases individuais considerando o contexto de todo o santo livro. A Escritura é
um produto da inspiração divina, de forma que palavras e frases individuais são
de fato importantes, tanto que doutrinas inteiras podem depender delas;
contudo, essas palavras e frases não permanecem sozinhas, e não mantém seus
significados no vácuo. E muito menos estão sujeitas a interpretações
arbitrárias impostas sobre elas.
O
mesmo apóstolo que escreve que a igreja é a coluna da verdade também prega que
Deus “não é servido por mãos de homens, como se necessitasse de algo” (Atos
17.25). Quão tolo deve ser então uma pessoa pensar que a metáfora aqui poderia
ser distorcida para significar que a igreja é o suporte da verdade no sentido
que a verdade iria se desintegrar se não fosse a igreja. Algumas pessoas falam
como se a apostasia dos homens pudesse frustrar o plano de Deus. Não, ela não
pode. Eu estou certamente preocupado com o estado da igreja e do clima
espiritual do mundo, mas somente como uma questão de zelo, e não por medo e
terror quanto ao resultado final. A verdade permanecerá quer a igreja permaneça
ou não. E a igreja permanecerá quer pareça haver muitos crentes fiéis ou não,
visto que Cristo disse que iria edificá-la, e que nem mesmo o inferno
prevaleceria contra ela. A metáfora refere-se a uma função da igreja, e não ao
seu poder inerente. Não há lugar para má interpretação.
Quanto
à ideia de fundamento, a palavra não sugere algo como uma fonte ou originador.
O fundamento de uma construção não é o designer, o construtor ou o criador do
edifício. É somente o local onde o edifício foi posto. Nem pode a metáfora
sugerir que a igreja é o fundamento da verdade no sentido que o fundamento de
um sistema intelectual consiste dos primeiros princípios a partir dos quais o
restante do sistema é deduzido. Isso acontece porque a igreja em si não é
nenhuma parte dos conteúdos de um sistema intelectual.
Se
a metáfora fosse sugerir uma ideia como construtor ou criador, ou fonte,
precisaríamos mais, quer do contexto imediato ou do pano de fundo da Escritura
para forçar essa interpretação. Isso está algumas vezes presente quando a
metáfora do “fundamento” é usada em outros lugares, mas o contexto e o pano de
fundo impedem essa interpretação aqui. Paulo instrui os cristãos a se
comportarem de uma maneira que sirva à verdade. Mas se a igreja produz a
verdade, então o que a igreja produz é a verdade. Contudo, Paulo não define a
verdade em termos da igreja, mas define a igreja em termos da verdade. A
verdade foi revelada por Deus, e é fixa. Quer uma comunidade seja ou não a
igreja depende de sua relação com a verdade.
Isso
aborda uma das questões mais prementes que os cristãos devem considerar, e eles
devem examinar suas comunidades à luz da resposta. O que a igreja deve ser? Há
alguns que dizem: “O que é a verdade?” E sua resposta é: “Pergunte à igreja. A
verdade é o que a igreja diz ser”. Essa não é a visão cristã. Antes,
perguntamos: “O que é a igreja?”. E respondemos: “Deus nos revelou a verdade
por meio da Escritura. A igreja é a comunidade que afirma essa verdade em
comum, e que promove e protege essa verdade sobre Deus e Jesus Cristo”.
Segue-se
que qualquer comunidade que falhe em afirmar, promover e proteger a verdade não
é a igreja. Se ela cessa de suportar e demonstrar a verdade como uma coluna, e
se não mantém reta e estável a verdade como um fundamento, então ela não é a
igreja. A coluna e o fundamento da verdade não é o que a igreja deve ser, ou
deve lutar para se tornar, mas sim o que a igreja é. Em outras palavras, se uma
assembleia não é uma coluna e fundamento da verdade, ela não é uma igreja. Não
importa o que faça – pode unir pessoas em amizades, pode se exceder em
caridade, ou pode advogar a justiça social – ela não é uma comunidade cristã.
Considere
dois exemplos. Há igrejas que se chamam assembleias cristãs, mas sua posição
oficial nega a inerrância da Escritura, que a Bíblia é um produto da inspiração
divina, de forma que é correta em cada detalhe e carrega autoridade absoluta.
Essas congregações perderam todo o sentido de verdade. Não há nenhuma base para
chamá-las de igrejas cristãs. Então, há algumas denominações que casam homossexuais,
e ordenam formalmente alguns deles como pregadores. Essas organizações não
funcionam como colunas da verdade, mas tentam redefinir a verdade afirmando
algo contrário à verdade já revelada por Deus.
A
Bíblia revela a verdade em proposições e doutrinas fixas, e define a igreja
como aquela que funciona como sua coluna. Essas denominações revertem isso em
seu pensamento e prática – sua suposição fixa é que eles são a igreja cristã, e
a verdade é o que declaram ser, e que a verdade está sujeita à modificação à
medida que as opiniões de homens mudam e se alteram. O pecado da
homossexualidade é importante, e não podemos ignorar o fato que essas
denominações o toleram. Mas a questão aqui é que sua política é somente um
resultado de uma apostasia mais geral, um abandono anterior da fé, no fato
deles já terem se afastado da verdade da revelação divina. E porque eles não
são o promotor e protetor da verdade, mas antes tentam inventar suas próprias
doutrinas de acordo com os sentimentos dos tempos, eles não são mais igrejas
cristãs.
O
que isso significa é que todos os cristãos deveriam denunciar essas
denominações e congregações que adotam tal política, e eles deveriam ser
considerados excomungados do reino de Cristo. Nenhum cristão deveria apoiar
essas denominações e igrejas com parte de seu tempo, dinheiro ou boa vontade, e
nenhum cristão deveria participar de suas reuniões como se estivessem
frequentando cultos cristãos. Sem dúvida, podemos nos dirigir a esses grupos
como assembleias não cristãs, chamando-os ao arrependimento e conversão por
meio da fé em Jesus Cristo e o assentimento genuíno à verdade.
Eu
endosso a ideia que deveríamos buscar a paz uns com os outros, e que nem toda
divergência doutrinária deveria resultar num rompimento total. Contudo, existe
uma tendência equivocada entre os cristãos de buscar a paz unindo-se ao redor
de uma quantidade mínima de verdade. Mas desde quando a fé em Jesus Cristo é
uma busca pelo mínimo? Antes, ela é uma proclamação de toda a revelação de
Deus, a verdade inteira sobre Deus que ele revelou. Ela é uma busca pelo
máximo, por um entendimento completo e por toda a plenitude de Deus.
Algumas
vezes é sugerido que quando consideramos a legitimidade de uma igreja,
deveríamos perguntar se ela transmite ou não pelo menos “o evangelho”, e
mediante isso quer-se dizer o mínimo da verdade. Mesmo que o mínimo
Cristianismo ainda seja Cristianismo, certamente não é bom Cristianismo, e é
contrário ao espírito da fé apoiá-lo. Um cristão mínimo, se é que existe tal
coisa, pode de fato ser um cristão, mas que ninguém o considere como um mestre!
E uma igreja mínima, se é que existe tal coisa, pode de fato ser uma igreja,
mas por que alguém deveria se unir a ela?
Fonte: Monergismo