Por Herman Bavinck
O estudo sistemático das verdades
da fé cristã é descrito por muitos termos diferentes. A designação “dogmática”
tem a vantagem de fixar esse estudo no estudo no ensino normativo ou dogmas da
igreja. Os dogmas são simplesmente aquelas verdades devidamente estabelecidas
na Escritura como coisas que devem ser cridas.
Uma verdade confessada pela
igreja não é um dogma porque a igreja a reconhece, mas unicamente porque ela
repousa sobre a autoridade de Deus. Não obstante, o dogma religioso é sempre
uma combinação da autoridade divina com a confissão da igreja.
Os dogmas são verdades
reconhecidas por um grupo específico. Embora os dogmas da igreja tenham
autoridade somente se forem realmente verdades de Deus, o ensino da igreja
nunca é idêntico à verdade divina em si. Ao mesmo tempo, é um erro desvalorizar
a maior parte dos dogmas como aberrações em inconstantes da pura essência do
evangelho não-dogmático, como fazem alguns teólogos modernos.
A oposição ao dogma não é uma
objeção geral ao dogma como tal, mas uma rejeição de dogmas específicos
considerados inaceitáveis por alguns. Dessa forma, a teologia depois de Kant
nega os dogmas arraigados em um conhecimento de Deus por causa do dogma moderno
de que Deus é incognoscível. Os dogmas arraigados na moralidade ou na
experiência religiosa são então colocados em seu lugar. Contudo, do ponto de
vista da ortodoxia cristã, a dogmática é o conhecimento que Deus revelou em sua
Palavra à sua igreja a respeito de si mesmo e de todas as criaturas em relação
a Ele. Ainda que objeções a esta definição em nome da fé geralmente provoquem
enganos, nunca se deve esquecer que o conhecimento de Deus, que é o verdadeiro
objeto da teologia dogmática, só é obtido pela fé.
Deus não pode ser conhecido por
nós sem a revelação recebida por meio da fé. A dogmática nada mais procura do
que ser verdadeira para o conhecimento de fé dado nessa revelação. A dogmática,
portanto, não é a ciência da fé ou da religião, mas a ciência sobre Deus.
A tarefa do dogmático é pensar os
pensamentos de Deus à maneira dele e estabelecer sua unidade. Esta é uma tarefa
que deve ser cumprida na convicção de que Deus falou, em humilde submissão à
tradição de ensino da igreja, para comunicar a mensagem do evangelho ao mundo.
O lugar próprio da dogmática na
grande enciclopédia do estudo teológico não é uma questão de grande debate. A
principal questão tem a ver com a relação entre teologia dogmática e a
filosofia. Nem a sujeição da dogmática aos pressupostos filosóficos nem a
separação dualista entre teologia confessional e o estudo cientifico da
religião são aceitáveis. Essa ruptura separa a vida dos professores de teologia
e dos pastores. Os esforções para “resgatar”
os estudos religiosos da acidez da filosofia modernista são um favor que
a igreja não pode deixar de aceitar. Todo conhecimento está arraigado na fé e
toda fé inclui um importante elemento de conhecimento. A tarefa da teologia
dogmática, em última análise, é nada menos que fazer uma exposição cientifica
da verdade religiosa com base na Escritura Sagrada. A defesa apologética dessa
verdade e suas aplicações éticas à conduta cristã estão baseadas e procedem da
revelação divina e da fé; elas não fundamentam ou dão forma à fé. A dogmática e
a ética são uma unidade, embora possam ser tratadas como disciplinas distintas.
A dogmática descreve os atos de Deus por nós e em nós; a ética descreve aquilo
que seres humanos renovados fazem agora com base e na força desses atos.
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Trecho da Dogmática Reformada de
Herman Bavinck, Vol. I