Por D.J. MacDonald
Os Puritanos entendiam por “primazia da pregação” que a
pregação era a parte mais importante da vida de um ministro. Quaisquer dons,
dotes ou conhecimentos que um ministro possuísse, eram para serem usados para o
grande fim de fazer dele um pregador.
O Apóstolo diz, “Porque Cristo enviou-me, não para
batizar, mas para evangelizar...” (I Co 1:17). Isso não significa que o batismo
não seja importante, mas que a pregação é mais importante. O próprio Paulo
assim afirma novamente, quando diz, “... ai de mim, se não pregar
o evangelho!” (I Co 9:16). A importância da pregação e a preparação para
tanto, como visto nos escritos e na prática dos Puritanos, é resumido
sucintamente nas palavras de J. C. Ryle: “Alguns podem estar prontos a dizer,
‘Eu trabalhei para Deus durante a semana inteira. Eu fui à escola, visitei de
casa em casa, distribuindo folhetos, e se meus sermões no dia do Senhor não são
tudo o que poderiam ser, de maneira nenhuma tenho sido preguiçoso.’ Devemos nos
lembrar que todas as obras nesta descrição, se interferem com a preparação dos
nossos sermões, trata-se de trabalho em vão”. Quantos de nós se
contentaria em dizer, “Passamos a semana visitando de casa em casa distribuindo
folhetos etc.”? Quão mundano é o que ocupa por demais a nossa mente durante a
semana, como podemos fazer disso uma desculpa para a nossa falta de preparação
de sermão?
Henry Smith (1550-1591), palestrante em St Clement Danes,
em Londres, escreve, “Se você precisa tomar cuidado com o que ouve,
então nós precisamos tomar cuidado com o que pregamos. Assim é que
Paulo não apontou ninguém mais como pregadores, senão aqueles que ‘manejam bem
a Palavra da verdade’ (II Timóteo 2:15), ou seja, em boas palavras e no método
correto; e porque ninguém pode fazê-lo sem estudo e meditação, portanto ele
ensinou a Timóteo a ‘apresentar-se à doutrina’, isto é, a fazer um estudo e
batalhar por isso. Pois como Pedro disse que nas epístolas de Paulo há muitas
coisas difíceis de serem entendidas, também nas epístolas de Pedro, de João e
de Tiago há muitas coisas que Davi, antes, chamou de maravilhas da lei, e Paulo
chamou de o mistério da salvação, e Cristo chamou de tesouro escondido no
chão”. “O trigo é bom”, continua Smith, citando Amós 8:6, “mas aqueles que
vendem o seu refugo são reprovados. Também a pregação é boa, mas esta recusa em
pregar não passa de blasfêmia, pois um toma o nome de Deus em vão, o outro toma
a Palavra de Deus em vão. Como nem todo som é música, assim nem todo sermão é
pregação, mas pior do que quem o faz ler uma homilia. Pois se Tiago nos exorta
a considerar o que pedimos antes de orarmos, muito mais deveríamos nós
considerar antes que venhamos a pregar”.
Ao enfatizar a importância da pregação, diz Perkins, “O
primeiro título de um ministro de Deus é mensageiro. Ele é o mensageiro do
Senhor das multidões. Em Apocalipse os ministros de sete igrejas são chamados
de anjos dessas igrejas; em outra passagem um ministro é um anjo do Senhor, e
em outra, o anjo da igreja — isto é, um anjo ou mensageiro enviado
por Deus à igreja. Este ponto tem ampla aplicação”:
Primeiramente, para os próprios ministros. Você deve
compreender a sua tarefa. Ministros são mensageiros: esta é a própria natureza
do seu chamado. Portanto você deve pregar a Palavra de Deus e entregá-la
exatamente como a recebeu. Embaixadores não portam sua própria mensagem, mas a
mensagem dos seus senhores e mestres, que os enviaram. Similarmente, ministros
portam a mensagem do Senhor das multidões e são, portanto, obrigados a
entregá-la como sendo a mensagem do Senhor, e não sua própria. A Palavra de
Deus é pura. Deve ser, portanto, estudada e entregue de maneira pura. Que todos
aqueles que são anjos de Deus — e desejam ser honrados como Seus
anjos e Seus embaixadores — devem cumprir com a responsabilidade de
um anjo de Deus, de forma que, como muitos homens desfiguram uma boa estória
pela forma como a contam, eles não tirem o poder e a majestade da Palavra de
Deus pela forma como a entregam!”.
“Em segundo lugar, se ministros são os anjos de Deus,
eles devem pregar a Palavra de Deus de tal forma que ela expresse e demonstre o
Espírito de Deus. Pregar na demonstração do Espírito de Deus é pregar com tal
simplicidade, todavia com poder tal, que mesmo aquele menos dotado
intelectualmente reconheça não ser um homem, mas Deus, quem o está ensinando. E
ainda assim, a consciência do mais poderoso possa sentir que não um homem, mas
Deus o está reprovando através do poder do Espírito. É tido com grande
admiração aos olhos do mundo, quando dizem de um pregador: ‘Ele é um sábio de
fato’, porque ele tem erudição, lê bastante, tem uma boa memória e uma boa
exposição. Mas o que recomenda um homem ao Senhor seu Deus e à sua própria
consciência é que ele prega com uma sinceridade adequada à habilidade, e tão
poderosamente à consciência do pecador, que este percebe que Deus está presente
no pregador”.
“Em terceiro lugar, há uma aplicação importante aos
ouvintes. Eles são ensinados que se os seus ministros são anjos enviados a eles
por Deus, então devem ouvi-los prazerosamente, de bom grado, reverentemente e
obedientemente, porque eles são enviados por Deus, e é a Sua mensagem que eles
entregam. Todos Cristãos devem fazê-lo, não somente quando a doutrina que é
pregada os satisfaz, mas também quando ela corta de lado a lado nossa corrupção
e é completamente contrária às nossas disposições. Pode ser altamente
desagradável e ferir nossos desejos naturais, mas desde que seja uma mensagem
do nosso Deus e Rei e o pregador seja o mensageiro daquele Deus, ambos, ele e a
mensagem, devem ser recebidos com respeito e com uma obediência que venha dos
nossos corações e almas. Esta é a razão porque respeito e honra devem ser
prestados por todos Cristãos aos ministros de Deus, especialmente quando eles
adornam o seu alto chamado com uma vida santa: eles são os anjos de Deus,
entregando as mensagens e as cargas que eles receberam de Deus”.
“O ministro de Deus é também um intérprete. Ele é
alguém que é capaz de entregar a reconciliação feita entre Deus e o homem; isto
é, primeiro, ele é alguém que pode expandir e explicar o pacto da graça, e
corretamente estabelecer como a reconciliação é alcançada. Segundo, ele é
alguém que pode aplicar, precisa e apropriadamente, os meios do operar externo
da reconciliação. Em Apocalipse, João recebe diretamente de Cristo. Ele deve
tomar o livro — isto é, a Escritura — e comê-lo. Então,
após tê-lo comido, ele deve ir e pregar aos povos, línguas e nações (Apocalipse
10:8 – 11). Através de João, Cristo ensina à Sua Igreja de forma permanente que
ministros não são capazes de pregar a nações e a reis, até que tenham comido o
Livro de Deus, ou seja, até acima e além de todo o aprendizado que o homem
possa transmitir, eles também são ensinados pelo Próprio Espírito de Deus. É o
seu ensino que faz de um homem um verdadeiro intérprete. Sem isso ele não pode
ser um intérprete. Como pode alguém ser intérprete de Deus para o Seu povo, a
menos que ele conheça a mente do Próprio Deus? E como pode ele conhecer a mente
de Deus, exceto pelo ensinamento do Espírito de Deus?”.
“O que estou enfatizando é isto: um ministro deve ser um
intérprete divino, um intérprete do que Deus tem a dizer. Portanto, ele não
deve somente ler o livro, mas comê-lo. Ele deve não somente ter o conhecimento
das coisas divinas fluindo em seu cérebro, mas gravado em seu coração e
impresso em sua alma pelo dedo espiritual de Deus. Para tanto, além de todo o
seu próprio estudo, meditação e uso de comentários e outros auxílios humanos,
ele deve orar como Davi, “Abre tu os meus olhos, para que veja as maravilhas da
Tua lei” (Salmo 119:18).
“Além disso, uma vez que ministros são intérpretes, eles
devem aspirar santificação e santidade em suas próprias vidas. Na profecia de
Isaías, o Reino da Assíria é dito ser santificado, ou separado, para destruir
os inimigos de Deus. Se um certo tipo de santificação é necessário para a obra
de destruição, quanto mais é a verdadeira santificação necessária para a grande
e gloriosa obra de edificação da Igreja de Deus ”.
Fonte: Revista Puritanos